Veliko Tărnovo fica no centro da Bulgária, um pouco a norte, e é uma das cidades mais antigas do país e parte da sua história revolucionária. Capital do Segundo Império Búlgaro, que teve fim com a invasão otomana, guarda ainda uma marca impressionante desse longínquo passado, a fortaleza Tsarevets. Não será a mais interessante das cidades búlgaras, mas é seguramente a de mais bonita implantação.

A cidade foi-se instalando ao longo dos séculos nas belas curvas do rio Yantra, ainda hoje de margens carregadas de vegetação. Algures no Neolítico, cerca de 5500 a.C., e depois os trácios, cerca de 3000 a.C., ambas épocas fizeram sua a colina onde resiste a cidadela / fortaleza Tsarevets. Para além dos trácios, também os romanos e os bizantinos ocuparam o lugar, cuja localização é naturalmente defensiva, e estes últimos ergueram os primeiros muros da fortaleza no século 6. No século seguinte chegaram as tribos eslavas, que aproveitaram igualmente o lugar. Mais tarde, em 1185 foi a vez dos irmãos Asen, Petar e Kaloyan, deixarem a sua marca na história e, então, também Tarnovgrad passou a ser parte importante dela, tornando-se o centro da rebelião contra os bizantinos que levaria à implantação do Segundo Império Búlgaro. Até que a chegada dos otomanos, em 1393, trouxe não apenas a queda daquele império, mas também a destruição da cidadela. Veliko Tărnovo estagnou durante a época otomana e deixou de ser tão relevante em termos estratégicos. Só com a libertação da Bulgária, em 1877, voltou a ter um papel de destaque e em 1879 foi nesta cidade que teve lugar a assinatura da primeira constituição búlgara, que instituiu o novo país, e anos mais tarde oficialmente proclamada a independência.





A Fortaleza Tsarevets, o lugar dos tsars medievais, ergue-se colina acima e na cidadela rodeada de muralhas e torres restam vestígios de 400 casas, 18 igrejas e 1 palácio real de onde 22 sucessivos reis governaram a Bulgária. Foi sendo, obviamente, reconstruída ao longo dos tempos, mas o aspecto actual resulta do restauro levado a efeito pelos comunistas que governaram o país na segunda metade do século 20. Na igreja do Sagrado Salvador, por exemplo, vemos murais interiores de estética “neo-realista” com cenas representando momentos da história dos séculos 14 e 15.



Não foi o ambiente bélico feito de canhões que nos seduziu na fortaleza, antes a bonita vista para a cidade que se espraia aos pés da cidadela, incluindo toda a sua envolvente com o irrequieto rio e uns imponentes maciços calcários. No meio da vegetação intensa descobre-se quer a Fortaleza Trapezitsa quer a igreja medieval em estilo bizantino de São Demétrio de Salónica, ambas do outro lado do rio, bem como a Igreja dos Quarenta Mártires, logo abaixo. Espalhados pela fortaleza veem-se vários projectores, parte do espectáculo de luz e som que é um dos eventos mais característicos de Veliko Tărnovo, que falhámos por não se ter realizado em nenhum dos dias que passamos por lá.





O centro desta que é a segunda maior cidade universitária do país pode ser como que dividido em dois. Uma parte mais recente e moderna, à qual não dedicámos tempo, e outra que conserva ainda o ambiente de outros tempos. Vale a pena deambular pela Samovodoska Charshiya, antiga rua do mercado, e pela rua Gurko, ambas ruas estreitas de pedra e casas pitorescas com varandas de madeira e apontamentos decorativos deliciosos.

Não faltam exemplos de arquitectura revivalista nacional, como o edifício da assembleia constituinte onde foi assinada a constituição búlgara, hoje museu.

Ou a Casa Sarafkina, construída em 1861 por um banqueiro rico, agora transformada numa mostra etnográfica.



As vistas do emaranhado de casas que sobem rio afora são incríveis, uma imagem inesquecível que nos fez lembrar Berat, a cidade das dez mil janelas, na Albânia, também península balcânica e também de influência otomana.

Do outro lado do rio, num cotovelo fechado do Yantra fica o monstruoso Monumento Asenevtsi, levantado em 1985 como representação da força medieval búlgara dos irmãos Asen. Um quase choque num lugar que é naturalmente tranquilo.


Perto de Veliko Tărnovo, 4 quilómetros montanha acima, está Arbanasi. A antiga nobreza vivia nesta pequena povoação e as casas otomanas foram muitas delas reconvertidas em alojamentos turísticos, mehanas (os restaurantes típicos) e museus. Está totalmente envolvida pela natureza e é um lugar de um sossego sem par. Krassimir Balakov, um dos ídolos dos sportinguistas no início da década de 1990, nasceu por aqui e tem casa na aldeia, disse-nos um búlgaro com quem metemos conversa, o único que conseguiu aliar o nome de Portugal ao futebol, coisa rara. No mais, não houve ninguém a quem o nome do nosso país suscitasse alguma reacção, sendo que o inverso também foi verdadeiro: “vão para a Bulgária? Quê?”; como se conhecem mal os países da União Europeia.

A uns 20 minutos de Veliko Tărnovo fica a cascata de Hotnitsa, também conhecida por Kaya Bunar, de significado “primavera na rocha”. Numa região cársica, com montes e vales, esta é a cascata mais popular da região, formada pela passagem de um rio. O acesso é fácil e logo depois do estacionamento há uma zona de piquenique mesmo em frente à cascata, que tem uma piscina natural. Diz que a água em queda não costuma secar nem nos meses mais quentes, e assim é. O sítio é bonito, mas apesar do calor a água só dá vontade de mergulhar aos indefectíveis da parceria natureza-cascata, como é caso da mana.



Mais distante, mas valendo a pena a viagem, está a Garganta Emen. Um curto eco-trail com cerca de 3,5 quilómetros (ida e volta) permite admirar as escarpas calcárias esculpidas pelo rio Negovanka, que criou uma admirável garganta natural, para além de algumas grutas. Também aqui o caminho transporta-nos a uma cascata, depois de uma passagem por um bonito bosque. Mas desta vez a cascata tinha apenas um fio de água. De qualquer forma, os amantes da natureza têm neste eco-trail mais um grande momento da Bulgária.