Seminário dos Olivais

O Seminário Maior de Cristo Rei dos Olivais foi fundado em 1931 e é parte do Patriarcado de Lisboa. Quase centenário, leva o nome Olivais mas fica no bairro da Portela, já concelho de Loures. Muito mudou desde a época da sua construção, num território às portas da capital em que apenas existiam quintas. Foi precisamente numa delas, na Quinta do Cabeço, que o arquitecto Porfírio Pardal Monteiro projectou aquele que ainda hoje é um dos maiores seminários em actividade no nosso país.

Toda a minha infância e a maior parte da vida foi vivida, precisamente, na Rua do Seminário e ainda hoje frequento diariamente o bairro. Os meus pais fizeram as fotos de casamento nos jardins do Seminário e as suas filhas cresceram a brincar nos mesmíssimos jardins do Seminário. Na época, as suas portas estavam sempre abertas a todos aqueles que o desejassem visitar. Hoje já não é assim, abrindo apenas em algumas datas. Aproveitámos uma dessas datas, o dia aberto de 5 de Novembro de 2023, para reviver memórias de há muito. E, voltando ao espírito da criança que já fomos, a maior curiosidade era ver se existia mesmo o “lago da gruta dos macacos”, algures lá para o final do Seminário. E não é que existe mesmo?

Os terrenos do Seminário dos Olivais já foram maiores. Com a construção do bairro dos Jardins do Cristo-Rei, havia também terrenos de freiras que acabaram por ser vendidos, não sei se com ligação ou não ao seminário, mas o certo é que a mata vencia em m2 a urbanização. Já não é assim, mas no final da longa álea que corre junto ao edifício do seminário, ainda resiste uma generosa mata. Mais, ela esconde efectivamente o tal lago. Um bonito lago, aliás, rodeado de vegetação que se espelha na água. E lá está uma torre e a tal gruta sob ela, felizmente sem viva alma para nos atormentar. Confesso que não tinha já ideia da beleza do lugar, talvez porque a memória estava dominada pelo medo que tínhamos em ir até ele pelas histórias que ouvíamos contar.

A História do Seminário dos Olivais diz-nos que foi fundado em 1931 pelo Cardeal Dom Manuel Cerejeira. Recém eleito Patriarca de Lisboa, dirigiu-se a Roma em 1929 e num encontro com o Papa Pio IX informou que desejava fundar um seminário, projecto logo encorajado pelo Papa. Na época, caída há pouco a Primeira República, vivia-se na sociedade portuguesa algum anticlericalismo, pelo que Cerejeira procurava incutir de novo o cristianismo entre os cidadãos e renovar a Igreja. Em Outubro de 1931 entraram os primeiros alunos no Seminário, este que se queria uma “escola de padres sábios e santos”, tendo como primeiro reitor Monsenhor José Manuel Pereira dos Reis – com o tempo, nomes como Dom José Policarpo (um dos mais marcantes, aqui permanecendo desde 1970 até 1997, data da sua morte) e Dom Manuel Clemente, dois dos últimos cardeais patriarcas de Lisboa, haveriam de lhe suceder. No início da década de 1960 chegaram a ser 182 os seminaristas, mas no final dessa década e no início da seguinte o número foi muito reduzido, por conta quer das mudanças sociais no Portugal pós-25 de Abril quer de desacordos com o Patriarca, que levou a uma crise entre os formadores com a recém-fundada Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. Nessa época chegaram a ser formados apenas 4 seminaristas. Actualmente, acolhe seminaristas das dioceses de Lisboa, Aveiro, Leiria-Fátima, Santarém e Santiago e Mindelo, em Cabo Verde. E habituei-me desde há muito a ver passar pela rua e pela praceta estes rapazes como os outros, sem deixar de admirar a sua atracção por esta vida espiritual e comunitária.

O certo é que o desejo do Cardeal Cerejeira em dar novo impulso de cristianismo à sociedade acabou por se manifestar no projecto arquitectónico do Seminário dos Olivais. Porfirio Pardal Monteiro foi o arquitecto encarregue de traçar as linhas do conjunto e é evidente o cunho modernista, à semelhança de outras suas obras na cidade de Lisboa, como os edifícios do Instituto Superior Técnico, do INE, do Diário de Notícias, do Hotel Ritz, da Gare Marítima de Alcântara e da Igreja Nossa Senhora de Fátima, o seu outro projecto “religioso”, posterior ao Seminário. Num estilo rectilíneo e depurado, sem excesso decorativo, eis o longo edifício onde os seminaristas ainda hoje estudam e vivem em comunidade.

O interior possui um sem fim de salas. Pudemos visitar as áreas comuns, como o refeitório, a biblioteca, salas de jogos e de estar, a varanda e a pequena e informal capela, entre outras. O modernismo revela-se um pouco por todo o lado, com destaque para as escadarias e as janelas.

E, claro, o Oratório, centro de tudo, igreja onde se celebrou missa neste dia aberto para todos os fiéis do exterior. Apresenta pormenores criados por Almada Negreiros, como os vitrais, as imagens do Sagrado Coração de Jesus e de Nossa Senhora de Fátima, o trono eucarístico e o painel de loiça que o enquadra, encimado pelo brasão do Cardeal fundador. De sua mulher, Sarah Affonso, é a cortina que pende frente ao trono e que representa o Calvário.

Nas traseiras do edifício do Seminário há um campo de futebol e uma horta, onde é costume ver e ouvir os seminaristas em momentos de evasão terrena. Há galinhas e pavões e, embora não tenhamos visto estes últimos, ouvimo-los bem desde casa. E na sua envolvente a tal mata do lago com gruta carregada de vegetação com árvores diversas. E diante si, para lá da álea principal protegida por uma fileira de árvores, um jardim de buxo com novo lago. Este é um jardim bem cuidado e bonito, o tal das fotos do casamento dos meus papas e, certamente, de muitos outros. Um segredo bem guardado para as novas gerações de habitantes da Portela que não tiveram a oportunidade de crescer com um espaço destes de porta aberta. Deste jardim vislumbra-se a parte superior da inconfundível Ponte Vasco da Gama, a pouquíssimos quilómetros, e é enquadrado pelo Paço Patriarcal, que tem sido morada dos últimos Cardeais Patriarcas de Lisboa.

No patamar superior está o seu jardim privado, com árvores carregadas de laranjas e limões que também pintalgavam a terra – ao preço a que a fruta está, como é possível os senhores padres não a apanharem 🙂 ? Os muros de entrada deste jardim estão revestidos a azulejo azul e branco, mais um motivo para apreciarmos neste conjunto. A sua varanda dá directamente para nova horta e, descobrimos agora, para o nosso prédio, precisamente na Rua do Seminário, um de muitos desta urbanização tão perto de um belo exemplar arquitectónico com detalhes artísticos para conhecer.

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