Fajão é uma aldeia em plena Serra do Açor e Pampilhosa da Serra, parte da rede de aldeias de xisto. Tudo ao seu redor é natureza pura, desde o xisto aos mais altos picos daquela serra, com espaço para o rio Ceira correr apertado entre eles, neste caso sob vigilância dos Penedos de Fajão. E o homem, para além de ter construído aqui uma aldeia de bonito casario, adaptou o terreno com socalcos e levadas, para melhor aproveitamento agrícola. Este é mais um passeio onde a paisagem segue de mãos dadas com a cultura.

Aproveitando o percurso pedestre sinalizado PR2-PPS, precisamente designado Voltinha ao Ceira, visitámos a aldeia de Fajão e caminhámos à sua volta, descendo à vizinha Ponte de Fajão e daí seguindo junto ao rio Ceira para depois atravessar o rio e voltar ao ponto inicial pela outra margem, desta vez a meia encosta dos Penedos de Fajão.




O Largo da Igreja de Fajão, onde se impõe um freixo monumental, é um bom ponto de partida. E o jardim junto a ele um excelente ponto de chegada, quer para um descanso quer para um eventual piquenique lado a lado com arranjos paisagísticos que incluem o verde da relva, árvores, um curso de água, uma pequena ponte em xisto e, mais acima, uma piscina e bar que abrem no Verão. O casario é predominantemente em xisto, recurso natural com forte presença na região, e as ruelas entrecruzam-se e seriam óptimas para nos fazer perder, não fosse a aldeia pequenina. Fajão é lugar antigo, tendo recebido carta de foral em 1233 e mantido a sede de concelho até à reforma administrativa e territorial de 1855. Para além da igreja matriz, destaque para a casa da câmara, algumas casas particulares do século 19, o forno comunitário e o Museu Monsenhor Nunes Pereira (que, encerrado, não visitámos, mas sabemos que reúne sobretudo objectos de âmbito etnográfico, alguns deles aproveitando o facto de o pai do Monsenhor ter sido escultor). No centro das Beiras, a localização geográfica de Fajão é privilegiada, tendo a aldeia sido deste há muito um ponto de passagem de almocreves e outros viajantes. Hoje restam os afortunados viajantes que até lá se propõem ir. A paisagem que a rodeia é fantástica, um verdadeiro “mar de montanhas” que caracteriza a Serra do Açor.



À saída da aldeia cujo nome derivará de Fayão, um nome próprio godo, um miradouro junto à Capela de São Salvador dá-nos panorâmicas dos Penedos, do vale do rio Ceira e de algumas ondulações da Serra do Açor. Uma delas é o Pico da Cebola, o mais alto da Serra, com 1438 metros de altitude. Mais para lá, sem se ver daqui, está também o Pico do Gondufo, onde nasce o rio Ceira, afluente do Mondego.






Descemos, sempre com belas vistas de montanha, e depois de passarmos pela aldeia de Ponte de Fajão passamos a acompanhar o Ceira, em muitos pontos por uma levada e por terrenos que foram objecto de recente derrocada (muita atenção, pois). Sempre à beira rio, pelo vale encaixado na base da crista quartzitica dos Penedos de Fajão, que se erguem abruptos na outra margem, vamos mirando as suas tranquilas águas e alguns recantos onde a vegetação envolvente acolhe azereiros (nesta região encontram-se as maiores áreas desta espécie) castanheiros e sobreiros, mas também estevas, urzes e rosmaninho. Veem-se pitorescas casinhas em xisto e terrenos da fértil várzea que em outros tempos estiveram cultivados (hoje, apenas um ou outro), em alguns pontos com as encostas dispostas em socalcos para melhor aproveitamento agrícola.


De volta a Fajão e terminada a caminhada, já de carro deixámos para trás os Penedos de Fajão , também conhecidos por Penedos de Penalva. Esta crista quartzitica escarpada, com 900 metros de altitude, está longe do tamanho dos mais altos picos da serra Açor, mas é igualmente dominadora. A sua aparência lembra antigas fortalezas implantadas de forma natural em penedos inexpugnáveis. Graças ao vento, a vegetação rasteira e arbustiva marca a paisagem de maior altitude da Serra do Açor, especialmente urze e rosmaninho, colorindo-a na Primavera de amarelo e rosa. Mas imediatamente abaixo dos Penedos, numa outra vertente e a altitude mais modesta, a vegetação volta a ser mais frondosa.






Já parte do concelho de Arganil, na aldeia de xisto de Casal Novo esconde-se o Poço da Cesta, mais um recanto do rio Ceira, desta vez em modo selvagem. Já se disse, os Penedos de Fajão vigiam-na altaneiros, mas as atenções viram-se por inteiro para o antigo moinho, a levada e, especialmente, para os poderosos blocos de rochas esculpidos pelo tempo e pelos elementos que tentam impedir o curso do Ceira. Sem sucesso, todavia, mas acabam por criar pequenos espaços, que fazem lembrar as cestas que dão o nome ao lugar. Ultrapassadas as rochas, o rio lá acaba por seguir sereno, marginado por amieiros, salgueiros e choupos, para além de uma generosa área plana verde, à qual não falta sequer uma parreira para compor o cenário. Deve ser tão bom passar aqui um dia de Verão.


Pouco mais adiante, também na divisão entre os concelhos de Arganil e da Pampilhosa da Serra, Vale Pardieiro guarda um segredo em mais um pedaço de rio surpreendente. A pequena povoação com pouco mais de meia dúzia de casas está instalada num monte que o Ceira procura contornar, fazendo uma curva. Acontece que o Homem, literalmente abaixo de Vale Pardieiro, por motivos agrícolas e mineiros escavou um túnel, desviando o curso do rio. Ou seja, o rio passou, também literalmente, a correr exactamente abaixo de Vale Pardieiro. O cenário é deveras invulgar. Ao lado de um antigo moinho acaba por jorrar a água, formando uma cascatinha saída do túnel, que tem de um lado o concelho de Arganil e do outro o da Pampilhosa da Serra.


E porque o Ceira foi um dos pretextos para este passeio, para o final do dia não resistimos a revistar a nossa praia fluvial preferida neste rio, a da Ponte Velha, já concelho de Góis, mas relativamente perto. O nome vem da Ponte Velha da Cabreira, construída no século 19, acompanhada de umas belas casas de xisto empoleiradas à beira rio, parte do antigo lagar de azeite tradicional de varas da aldeia da Cabreira, que faz com que o lugar seja igualmente conhecido por Ribeira do Lagar. Todo o conjunto faz deste um lugar de um encanto imenso, a que lhe acresce uma língua do rio Ceira verdadeiramente deliciosa e um açude que faz a água, numa curva repentina, correr mais veloz e barulhenta. O espaço foi recentemente renovado e transformado numa cómoda praia fluvial.
Para saber mais sobre o rio Ceira, é clicar aqui – em tempos dedicámo-nos a ele, tentando percorrer grande parte do seu curso, desde a foz até à nascente, agora complementado por novos pontos de paragem.