Ilha de Skye

A ilha de Skye é uma das cerca de 800 que fazem parte do território da Escócia. Igualmente parte das Terras Altas (Highlands), na maior das ilhas das Hébridas Interiores encontramos reunidas todas as características que tornam aquela região numa maravilha: lagos, montanhas e vales, resultando em paisagens a perder de vista. E ovelhas, muitas ovelhas. Uma terra de mitos e de histórias de clãs, de castelos e masmorras, onde a imaginação flui à solta. Onde, enfim, tudo parece poder acontecer.

Uma ponte e dois ferrys ligam a ilha de Skye às restantes Highlands “continentais”. Ainda assim, sente-se o seu isolamento geográfico que, acreditamos, será ainda mais arrebatador nas ilhas menos acessíveis. O nome Skye deriva das palavras do antigo norse “ski”, de significado nuvem, e “ey”, de significado ilha. Hoje, este é um dos últimos bastiões do gaélico – diz-se que são 60 mil os falantes nativos, cerca de 1/3 dos seus habitantes – e esta língua marca presença nos nomes das montanhas e das ilhas, mas também nos sinais trânsito. São 7000 milhas de costa, entrecortada por uma série de penínsulas e baías, com o centro dominado pelo Cuillin Hill, todos estes elementos testemunhas de 500 milhões de anos de história. Uma história, mais antiga, geológica e uma história, mais, recente, feita pelo Homem. A primeira evidência de ocupação humana na Skye é de meados da Idade da Pedra (cerca de 6500 a.C.). Durante o Neolítico (3000 a.C.), indivíduos vindos do continente pelo mar trouxeram gado, ovelhas e cereais, e o envolvimento com a agricultura permitiu que se tornassem algo sedentários, permanecendo por um bom tempo. A Idade do Ferro (700 a.C.) trouxe disputas territoriais, com a implantação de diversos fortes no topo de montes e em promontórios (duns, brochs e hillforts, assim são conhecidas estas estruturas na Escócia). Até que o início da nossa era viu uma confederação de tribos (os Picts) juntar forças no sul da Escócia para se oporem aos romanos. Em 750 deu-se o primeiro ataque Viking na Escócia, precisamente na ilha de Skye. À semelhança das restantes Highlands, até ao século 19 os chefes dos clãs dominavam o território, até que o que ficou conhecido como The Highlands Clearances levou ao desalojamento e emigração forçada de milhares de habitantes, substituindo-se o anterior sistema agrário pela ocupação em massa das terras por ovelhas, mais lucrativas do que os homens. Muitos glens (vales) ficaram despovoados e não é à toa que por todo o lado se vejam, ainda hoje, muitas ovelhas em cada canto da ilha. Neste antigo reino de vikings, guerreiros e kelpies, os diabos que se transformam em cavalos para reclamar as almas das crianças depois de as afundarem nas águas profundas, há ainda pegadas de dinossauros para descobrir (em Staffin). São, todavia, os cenário de tirar o fôlego que mais entusiasmam.

Skye
Skye
Staffin
Staffin
Staffin

A Skye é, por vezes, referida como a misty island, a ilha do nevoeiro, tal a frequência com que é envolvida pela bruma. Acontece que, nem o nevoeiro e, já agora, nem a chuva ou o vento, estragam as cenas, antes as tornam místicas, um lugar onde o poder da natureza é senhor absoluto. O vento, esse, dizem que mais não é do que o cântico dos guerreiros. Mas as suas paisagens não são apenas grandes momentos cénicos, são também, como já referimos, uma viagem pela história. Com efeito, algumas das mais antigas rochas da Europa podem ser encontradas na ilha. Parte da ilha foi formada pela actividade vulcânica e as escoadas lávicas dominam ainda hoje a paisagem, sendo o Old Man Storr e Quirang os seus maiores e mais reconhecidos exemplos, ambos na Península de Trotternish.

The Old Man of Storr

O Old Man of Storr é a paisagem mais icónica da Skye. A pouca distância de Portree, a maior povoação da ilha, os pináculos que fazem a sua fama vão se vislumbrando à aproximação do lugar. É um conjunto de inimagináveis formações rochosas, de que o Old Man of Storr é a mais famosa. Estas formações são o resultado de uma série de erupções cujos fluxos de lava levaram a desprendimentos das falésias, algo ocorrido há cerca de 60 milhões de anos – antes disso, na Idade do Gelo, toda esta área estava coberta por gelo glaciar. E, precisamente, o maior conjunto dessas formações pode ser visto nos pináculos de Storr, tendo sido aqui identificados 24 fluxos de lava individuais que variam de 1 a 30 metros de grossura – os mais recentes são mais irregulares e incluem pináculos tão distintos como o Old Man of Storr e o Needle Rock: são autênticas esculturas de rocha com camadas de lava. Ainda hoje, quedas intermitentes de rochas mostram que esta paisagem ainda não terá cessado de mudar.

Trilho para Old Man of Storr
Trilho para Old Man of Storr
Trilho para Old Man of Storr

Uma relativamente curta e aprazível caminhada leva-nos até estes pináculos, podendo admirá-los de perto e perceber com exactidão todos os pormenores da sua forma que, aliás, vai mudando conforme o lado em que os observamos. Para além disso, a paisagem que envolve o Old Man of Storr é fabulosa, um manto verde salpicado pelo escuro da rocha basalto e entrecortado por lagos, com o mar mesmo ali ao lado, dividindo a Skye de uma outra ilha, espaço conhecido por Sound of Raasay, nome da dita ilha.

Old Man of Storr
Old Man of Storr
Old Man of Storr
Old Man of Storr

O pináculo conhecido como The Old Man of Storr, de significado “o grande velho”, é uma rocha de basalto vertical com 55 metros de altura. Nem ele escapa aos mitos, havendo quem goste de acreditar que é o que resta de um gigante. Cada um dos pináculos / rochas tem nome atribuído, como Sanctuary (Santuário) ou Needle Rock (Pedra Agulha), este último também conhecido como Catedral, distinta com a sua janelinha no cimo.

Quirang – Cordilheira Trotternish
Quirang

Quirang, por sua vez, é considerada uma das partes geologicamente mais activas do Reino Unido, continuando, lentamente, a colapsar sobre camadas de basalto vulcânico. De significado “Dobras Redondas”, também por aqui há que caminhar até próximo das fantásticas formações rochosas para delas extrair a melhor percepção, embora o caminho ao seu redor seja mais labiríntico. Porém, desde o estacionamento já se obtém uma panorâmica grandiosa, não apenas do Quirang como também da maravilhosa Cordilheira Trotternish.

Quirang
Quirang
Quirang
Quirang

À semelhança do The Old Man of Storr, as formações rochosas possuem nomes, como The Needle, um pináculo de 37 metros, The Prison, uma cavidade debaixo de uma rocha piramidal que se assemelha a um castelo medieval, e The Table, uma área escondida coberta de relva. Dado o adiantado da hora, apenas caminhámos até ao The Needle, o que nos encheu totalmente as medidas.

Vista do Fairy Glen
Fairy Glen
Fairy Glen
Fairy Glen

Perto, há um vale de encantar, o Fairy Glen. Como que um mini Quirang, as suas formações rochosas, com torres cónicas em miniatura rodeadas de um verde intenso, onde as ovelhinhas relaxam indiferentes à paisagem, não deve andar muito longe da imagem que criámos de paraíso. Uma dessas formações é chamada de Castelo Ewen, um pináculo basáltico natural que parece uma fortaleza medieval, de cujo cume se avista mais uma bela paisagem.

Sligachan Old Bridge

Uma lenda conta que por séculos nenhum ser vivo habitou esta ilha montanhosa. Até que chegou Skiach, uma grande guerreira, e logo criou uma escola de arqueiros, tendo a sua fama chegado aos ouvidos de Cuchullin, o herói gigante do Ulster, considerado pelos irlandeses o maior guerreiro do mundo. Então, Cuchullin veio até Skye, para com os seus próprios olhos ver Skiach. Esta não lhe prestou qualquer reverência, o que não foi do seu agrado. Despeitado, Cuchullin desafiou os seus alunos arqueiros, a quem derrotou, e em seguida foi-lhe dada permissão para combater a filha de Skiach, uma honra só concedida aos grandes. Após um longo combate, Cuchullin venceu-a e uma enraivecida Skiach decidiu ela própria combatê-lo. Por 4 dias e 4 noites combateram ambos na mais alta das montanhas da ilha, mas nenhum deles logrou sobrepor-se ao outro, acabando por decidir tornar-se amigos. E foi assim que Skiach nomeou as montanhas onde lutaram de Cuchullin, hoje Cuillins na sua forma inglesa.

Skye
Sròn Bhiornal

Outra lenda conta que Sròn Bhiornal (ou Sron Vourlinn, nome pelo qual é mais conhecido) é o lugar de enterro de Biornal, uma princesa dinamarquesa. Viajava com o seu pai num galeão quando adoeceu e o barco foi forçado a atracar na Flodigarry Bay. Porém, antes de morrer pediu ao pai para ser enterrada no alto da montanha, onde poderia ficar para sempre acompanhada pelas brisas da Escandinávia. Sròn Bhiornal / Sron Vourlinn é um pico montanhoso com uma forma admirável, mais uma daquelas que, não ignorando o poder da obra da mãe natureza, mais parece efectivamente ter sido esculpido por uma deusa.

Kilt Rock
Kilt Rock e Mealt Falls

Mas as maravilhas naturais não se ficam apenas pelas formações rochosas de espanto. Não faltam quedas de água incríveis, como a Mealt Falls, cuja água vem do lago de mesmo nome que está junto a ela e se despenha directamente no mar por uma altura de 60 metros. A sua espectacularidade vem também do facto de se situar numa falésia / costa marítima conhecida como Kilt Rock, formada por colunas de basalto que se assemelham às pregas das saias dos escoceses, os kilts, daí o seu nome. É nestas alturas que desejava ter asas, como os pássaros, para poder admirar este maravilhoso cenário na sua plenitude.

Invertote Bay
Lealt Falls

As Lealt Falls, não muito distantes, são outras cascatas que se sucedem vindas do rio de mesmo nome, desta vez envolvidas na vegetação. Duas plataformas diferentes permitem percebe-las do alto e depois de percorrido o caminho até à Invertote Bay chegamos junto ao seu último lanço. Nesta baía, que apenas admirámos de cima, encontramos as ruínas de edifícios que serviram de apoio à pesca do salmão e ainda as ruínas de uma antiga fábrica que processou diatomito, uma rocha clara que vinha de minas aí perto.

A caminho das Fairy Pools com os Cuillins em frente
Vale das Fairy Pools
Fairy Pools

Outro dos lugares imperdíveis para se assistir a uma sucessão de quedas de água que, desta vez, formam um sem número de piscinas naturais são as Fairy Pools (Allt Coir a’ Mhadaidh), alimentadas pelas fontes das montanhas Cuillin. Na costa sul da Skye, as Fairy Pools estão acompanhadas do bonito vale Glen Brittle e ficam no sopé das Black Cuillin, diz que as mais espectaculares e desafiantes das montanhas britânicas. Mas, aqui, o desafio maior é ousar mergulhar o corpo nas águas gélidas das pequenas poças, o que não ousámos, ou tão somente submergir o rosto nas ditas águas, a fim de comprovar o mito de que assim alcançaremos a eterna juventude, o que também não comprovámos.

Trilho para Talisker Bay
Trilho para Talisker Bay
Talisker Bay
Talisker Bay

E por falar em vales, o que mais nos espantou foi aquele que, uma vez atravessado, nos permite alcançar a Talisker Bay. Talisker é o nome do famoso whisky distilado, mas para nós será para sempre um dos lugares mais fabulosos da Skye. Igualmente na costa sul, na península de Minginish, e de uma beleza sem par, coroado por mais uma cascata majestosa. E foi aqui que, finalmente, encontrámos uma das tão desejadas vacas cabeludas, típicas das Highlands escocesas.

Coral Beach
Coral Beach
Coral Beach

No noroeste da Skye, na região de Dunvegan, há dois lugares imperdíveis a visitar. A Coral Beach é apontada como a mais bonita das praias da ilha, e muito merecidamente. De areia branca e de água azul turquesa absolutamente transparente, soma a estes factores mais um cenário belíssimo. Para mais, é um lugar recolhido, pouco frequentado, um daqueles onde mais facilmente se alcança o sentimento de isolamento que a ilha nos oferece, um isolamento quase poético que nos deixa totalmente absorvidos na paisagem. E a Coral Beach possui outro interesse, a biodiversidade marinha. A sua areia – e água – está cheia de algas coralinas, conhecidas internacionalmente por maërl, que crescem muito lentamente e vivem até cerca de 8000 anos, possuindo uma grande quantidade de carbonato de cálcio e usadas localmente por agricultores e artesãos para enriquecer o solo com cálcio, como que um fertilizante natural.

Castelo Dunvegan
Castelo Dunvegan
Castelo Dunvegan
Castelo Dunvegan

Quase vizinho é o Castelo Dunvegan, com ocupação contínua pelo clã MacLeod por cerca de 800 anos (ainda hoje é ocupado por um seu descendente directo, Hugh MacLeod, o 30° chefe do clã), facto único no norte da Escócia. À beira do lago Dunvegan, a casa dos MacLeod vem, assim, desde o século 13, mas o seu edifício data de várias épocas; por exemplo, o The Keep, a fortaleza, é do século 13, a Fairy Tower de 1500, a ala sul e a Rory Mor’s House do século 17, a ala norte do século 18 e o pórtico de entrada com colunada do século 19. Visitamos os espaços palacianos, passando por diversas salas que nos mostram pinturas e artefactos vários e contam a história do lugar e sua relação e influência na história da Escócia, com destaque para a ligação de Flora MacDonald na ajuda a Bonnie Prince Charlie na entrada na Skye, fugido do “continente”, após a derrota dos Jacobitas na Batalha de 1746, onde tentaram depor o Rei George II, tudo personagens heróicas escocesas.

Jardim do Castelo Dunvegan
Jardim do Castelo Dunvegan
Jardim do Castelo Dunvegan
Jardim do Castelo Dunvegan
Jardim do Castelo Dunvegan
Jardim do Castelo Dunvegan

E há ainda o muito bonito jardim do castelo, com floresta, com origem no século 17, embora o rectangular Walled Garden (Jardim Murado) seja de 1811. É aqui que a história do jardim do castelo realmente começa, acompanhando o que então era típico das casas escocesas do período Vitoriano, quando, movidos pelos princípios do romantismo, se começou a plantar árvores em grande escala mas mansões. Mais tarde foi criado o Round Garden (Jardim Redondo) e desde 1978 tem havido um grande investimento na replantação dos jardins, para os devolver à sua antiga glória. Para além dos dois referidos jardins, há cascatas, espaços frondosos e espaços tranquilos e até um bonito relógio de sol no centro do Jardim Murado.

Castelo Duntulm
Castelo Duntulm

De volta à Península Trotternish, norte da Skye, outro castelo merece uma visita. Originalmente uma fortaleza Pictish que fazia parte de uma rede de estruturas defensivas ao longo da costa norte da ilha, todas visíveis umas das outras de forma a avisarem-se de ataques inimigos, o Castelo de Duntulm é uma ruína à beira mar cheia de ambiente. Perto tem o ilhéu Tulm, o que lhe confere ainda mais graça. Há muito tempo, na altura da invasão das ilhas pelos norses, tornou-se residência de um poderoso líder viking, demonstrativo das várias ocupações da ilha.

Uig
Skye Museum of Island Life
Skye Museum of Island Life
Skye Museum of Island Life

Por aqui, a caminho de Uig, fica o Skye Museum of Island Life, um museu ao ar livre composto de várias casinhas de arquitectura popular que nos fazem ter uma ideia do que era a vida do dia a dia que os seus habitantes levavam até há pouco tempo. Enquadrando a organização agrícola e social em que assenta a Skye, onde predomina o minifúndio que era antes a base do sistema e hoje ainda dá algum proveito aos habitantes, vamos visitando a Casa do Velho Croft, a Casa do Tecelão, o Velho Celeiro, a Casa do Ferreiro e até a loja local, que servia de café e onde se vendia de tudo o que não era produzido localmente, para além de servir de correios, numa época em que a viagem a Portree levava um dia inteiro de caminhada a pé ou, para uns poucos mais sortudos, a cavalo. Em cada um delas, é-nos apresentado um espaço expositivo acerca da história e dos costumes regionais. E o interior de algumas das casas foi reconstituído, como quartos, salas, cozinhas, com roupas, lãs e tear, tendo sido reunida decoração antiga e objectos e artefactos do uso do dia a dia ou do trabalho. E não falta a alusão à pesca, actividade igualmente muito importante na ilha.

Portree
Portree

Por fim, uma visita a Portree, a base de muitos dos visitantes da Skye. Sua capital e maior povoação, é muito pitoresca, com uma bonita baía e casas coloridas, para além de um porto, muito à altura dos elementos grandiosos que daqui partimos a explorar.

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