Florença – o Duomo

É difícil de abarcar numa só mirada todo o conjunto monumental da Praça do Duomo – Duomo, Baptistério e Torre Giotto -, não apenas por estarem sempre magotes à nossa frente, mas também por ser efectivamente incrível como se condensam tantos edifícios maravilhosos num espaço tão pequeno. Diante deles, e perante uma luminosidade belíssima e delicada, irradiando luz por todo o lado, não sabemos em qual deter o olhar e demora até conseguimos fixar nos detalhes decorativos das fachadas.

Santa Maria del Fiore é o nome oficial do Duomo, a Catedral de Florença. “Santa Maria da Flor” por referência ao lírio, símbolo da cidade desde o século 13 (uma flor de lis vermelha sobre fundo branco). Mas também o Duomo é um símbolo de Florença, bem como da renascença e do humanismo em geral. De quase todo o lado o vemos, e sempre que o vislumbramos é uma alegria.

Revestido de mármore tricolor, rosa, verde e branco (o branco de Carrara era o preferido de Michelangelo), tem 153 metros de comprimento, 90 metros de largura e 116 metros de altura no total e é a terceira maior igreja do mundo, depois São Pedro, em Roma, e São Paulo, em Londres. É uma desmesura. Mas, curiosamente, a fachada permaneceu lisa até 1887, altura em que foi totalmente reconstruída em estilo neo gótico, seguindo de perto as ideias que Giotto havia tido para ela séculos antes.

Os primeiros planos para construir o Duomo surgiram em 1296. Já existia o Baptistério, Arnolfo di Cambio (o da torre do Palácio Velho) ficou responsável pelo projecto mas morreu entretanto, em 1334-1359 foi construída a Torre- Campanário Giotto, em 1348 a Peste Negra assolou a cidade e a construção do Duomo parou novamente. Mas não pararam os desenhos e as ideias para o projecto. Sob inspiração da arquitectura persa e islâmica, em 1418 a base do Duomo estava completa e foi então lançado concurso para a construção da cúpula. É aqui que Filippo Brunelleschi entra na história ao propor construir – e construir efectivamente entre 1420-36 – a estrutura da cúpula sem elementos de suporte, coisa jamais vista até então. Ou seja, demorou 140 anos até o Duomo estar finalmente completado.

Existem diversos tipos de bilhete para a visita aos edifícios monumentais do Duomo. Cada passe tem o nome de um dos artistas que criaram as obra-primas da Praça: o Passe Brunelleschi dá acesso a tudo (Cúpula, Torre-Campanário Giotto, Baptistério, Grande Museu do Duomo e Catedral Santa Reparata), o Passe Giotto a tudo excepto a Cúpula e o Passe Ghiberti a tudo menos à Cúpula e à Torre. Os preços em 2022 estavam em 30 euros, 20 euros e 10 euros, respetivamente. A visita à Cúpula implica a subida de 463 degraus e a subida à Torre de 414 degraus e deve ser apenas o esforço físico o critério que nos pode demover a não visitá-las – escusado será dizer que é uma oportunidade única para apreciarmos de perto quer os pormenores artísticos quer técnicos destas estruturas, para além da esmagadora vista panorâmica de Florença e arredores que se obtém do alto.

A visita ao interior do Duomo é, pois, a única gratuita. Erigido sobre a Catedral Santa Reparata, do século 5 (as ruínas arqueológicas da sua Cripta são acedidas por uma escada desde o interior da actual Catedral), o interior da Catedral está hoje despojado de decoração, uma vez que as obras que aqui estiveram ao longo dos tempos estão agora no Grande Museu do Duomo. Ainda assim, vale a pena vencer a espera na fila para perceber não apenas a sua dimensão, mas sobretudo os frescos da cúpula representando o juízo final, criados por Giorgio Vasari e Frederico Zuccari no século 16.

A subida à Cúpula de Brunelleschi, a tal obra de engenharia que se pensava impossível na época (um vídeo no Grande Museu do Duomo mostra detalhes da sua construção), é marcante. Vamos subindo e subindo os 463 degraus e espreitando a cidade numa ou noutra aberta até que ficamos bem perto dos tais frescos de Vasari e Zuccari da cúpula, cujo diâmetro mede 45,5 metros. Que cor. Olhamos para baixo, com a catedral despida, e vemos o quanto já subimos, mas ainda faltam mais uns quantos degraus para a incrível vista da cidade.

A Torre-Campanário de Giotto é de uma graciosidade e elegância tocantes. Considerado o mais bonito campanário de Itália, esta torre sineira tem 85 metros, sendo ainda assim mais baixa do que a Cúpula, e é o maior exemplo da arquitectura gótica na cidade. Terá sido desenhado mais por questões decorativas do que funcionais, e ainda bem que o foi. Destaque para os seu tons delicados e para os baixos-relevos na fachada, nomeadamente os 28 baixos-relevos de Andrea Pisano representando os ofícios humanos.

A subida à Torre Giotto traz-nos a mesma paisagem da subida à Cúpula de Brunelleschi, mas agora acrescentada por uma vista privilegiada para esta última. Ficamos tão perto desta belíssima Cúpula que quase podemos tocar nas suas inconfundíveis telhas vermelhas de terracota. O mesmo para o Baptistério, logo aos nossos pés. Uma curiosidade, no dia de Verão da nossa subida à Torre os termómetros ultrapassavam os 40°, mas enquanto o tempo ardia lá em baixo, em cima o que se sentia era uma brisa fresca. Inesquecível, o prazer de contemplar Florença do alto com a brisa do vento a amaciar-nos o rosto.

O Baptistério São João Baptista é o mais antigo elemento do conjunto do Duomo. Construído no século 11, em estilo romanesco, é uma estrutura octagonal em mármore branco e verde típico do românico florentino. Novamente, a sua cor é linda. Mesmo junto ao Baptistério, porém, somos ofuscadas pelas suas três portas, duas em bronze e uma em ouro. Esta, a “Porta do Paraíso”, do século 15, é obra de Lorenzo Ghibert e o original está no Grande Museu do Duomo. O interior do Baptistério evoca o Panteão de Roma e Dante foi um dos florentinos que aqui foi baptizado.

Por fim, no Grande Museu do Duomo podemos conhecer o tesouro do Duomo, Torre e Baptistério. O ponto alto são os originais das referidas portas do Baptistério. A tal “Porta do Paraíso” de Ghiberti tem 16 metros de altura e esta decorada num ouro tão incandescente que o difícil é parar de contemplá-la. O Museu possui ainda uma Pietá de Michelangelo, entre outras obras de grande nível.

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