O Jardim da Cerca da Graça é um pedaço de verde encravado no centro histórico de Lisboa. Criado em 2015, liga os bairros da Mouraria e da Graça e fica na encosta entre os miradouros da Graça e da Senhora do Monte. Não poderíamos pedir um melhor cartão de visita.

Com entrada pela Rua das Olarias e pela Calçada do Monte, o amplo relvado é o destaque imediato deste jardim, mas aqui temos ainda árvores, um quiosque, uma esplanada, uma varanda-miradouro, um parque infantil e até uma zona de pomar.

Dada a sua implantação geográfica, a meia encosta, sentimo-nos como que num esconderijo, imaginando que daqui tudo vemos sem sermos vistos. Esta última parte pode não passar de desejo, mas que daqui muito avistamos, ai isso é verdade. O belo miradouro da Senhora do Monte está lá ao fundo ao alto, quase escondido entre os prédios, mas sem deixar de dar a perceber a sua inconfundível copa das árvores que lhe faz de chapéu.

Na vertente contrária, no cimo de uma das colinas mais visitadas da cidade ergue-se dominador o Castelo de São Jorge, também a pretender esconder-se atrás de algo, desta vez de uma imensa fileira de árvores. Uma das surpresas deste jardim é percebermos como pode ser verde e cheio de vegetação o centro histórico de Lisboa.

E, bom, falta-nos referir o outro elemento preponderante na paisagem do Jardim da Cerca da Graça. Porquê cerca? A cerca é a cerca do antigo Convento da Graça, que lhe está imediatamente adjacente na parte superior, e cuja torre da igreja tenta igualmente passar despercebida por entre a ramagem. Este espaço verde é o resultado da requalificação e transformação da cerca do antigo Convento da Graça (actualmente ocupado pela GNR) em jardim público.

Após a visita ao jardim, vale a pena subir pelo Caracol da Graça até ao adro da Igreja da Graça para, desde o Miradouro Sophia de Mello Breyner, abraçarmos uma das vistas mais fabulosas de Lisboa. Não são necessárias palavras diante deste “admirável panorama”, mas perante aquelas redigidas por Raul Proença no volume Lisboa e Arredores da sua enorme obra “Guia de Portugal” não resistimos a reproduzi-las:
“Abaixo apinha-se a casaria da cidade, num conjunto muito pitoresco. Ao sol dos belos dias portugueses, de céu muito azul, tudo aquilo resplandece num deslumbramento. À esq. tapa o horizonte o morro do Castelo, de encostas vestidas de olivedo, enquanto à dir. outro mirante, o monte de São Gens, se debruça sobre a cidade. A O., na frente e ao fundo, as torres e zimbório da Estrela. Entre estas três elevações cava-se o vale polícromo, rasgando-se ao S. uma nesga do Tejo até à barra, para além da qual se arredondam as colinas da Outra Banda. Entre a massa enorme dos edifícios, como que semeados à aventura, numa confusão inextricável, com as suas brancas frontarias e os seus telhados vermelhos resplandecentes, um ou outro ponto se marca, mais preciso. Abaixo do jardim de S. Pedro de Alcântara, a est. do Rossio; vem depois a estátua de D. Pedro IV, de que se avista uma parte considerável da coluna, a igr. do Socorro, o hospital de S. José, a Escola Médica, a estátua de Sousa Martins, a Penitenciária. Ao longe os cimos desnudados da Serra de Monsanto. Para O. as belas ruínas do Carmo dão uma nota de pitoresco arqueológico, enquanto a massa do Jardim Botânico repousa os olhos numa mancha de verdura.”
Quase cem anos depois, continua lá tudo.