Palácio Nacional de Mafra

O Palácio Nacional de Mafra é imponente a todos os níveis. Desde logo pela forma como se afirma na paisagem da região. De longe já o estamos a observar seja qual for a direcção que tomemos para chegar a Mafra. Primeiro como um longo corpo com torreões e cúpula, depois como um real palácio e convento. Real de verdadeiro, mas ao mesmo tempo real de realeza.

Foi D. João V que na primeira metade do século XVIII mandou construir em Mafra um convento como cumprimento do voto que fizera para conseguir sucessão no seu casamento. Mas este convento viria a ser muito mais do que apenas um convento. Para além de integrar também um Paço Real, uma Basílica e uma Tapada, é hoje encarado como uma afirmação do poder absoluto e de legitimação da Casa de Bragança numa então época pujante do Império Português. E acabou ainda por entrar na história e na cultura do nosso país, inspirando José Saramago no seu mordaz “Memorial do Convento” com as marcantes personagens Blimunda Sete-Luas e Baltasar Sete-Sóis.

Tudo no Palácio é em grande.

Desde logo, a sua extensa fachada, com 220 metros de comprimento, um torreão em cada lado e a Basílica no eixo central, numa simetria cativante. Na traseira fica o antigo Convento, o qual após a extinção das ordens religiosas em 1834 veio a ser ocupado por diversos regimentos militares, sendo hoje sede da Escola de Armas. Mas sobretudo pela bela e equilibrada arquitectura deste monumento barroco e pela superior qualidade e uso dos seus materiais, maioritariamente mármores.

A direcção desta obra monumental ficou a cargo de João Frederico Ludovice, que buscou inspiração na Roma de Bernini e de Borromini.

Este Paço Real, apesar de então distante da sede do reino, era visitado amiúde pela família real, que gostava de aqui celebrar festas religiosas e de caçar na Tapada. Foi aqui, aliás, que D Manuel II, o último rei de Portugal, passou a sua última noite antes de deixar o reino rumo ao exílio na sequência da Implantação da República a 5 de Outubro de 1910. Logo no ano seguinte o conjunto tomou a designação de Palácio Nacional de Mafra e foi transformado em museu.

A entrada é efectuada por uma porta à esquerda da Basílica e logo temos os claustros diante de nós. Não são certamente os seus claustros que fazem a fama merecida do Palácio de Mafra. São discretos e pouco monumentais, mas não desiludem porque muito de belo haveremos de ver em seguida.

Subida a escadaria para acesso ao Piso Nobre do Palácio, surge diante nós a Sala de Diana. As pinturas do tecto a representar Diana, a deusa da caça, são belíssimas e esta é uma excelente ante-sala para a Sala de Audiência (ou do Trono) que se lhe segue. Esta sala destinava-se às audiências régias e apesar da pouca luz percebe-se que este é mais uma sala com pinturas fantásticas. O tecto tem representada uma alegoria à Lusitânia e as paredes pinturas com as oito virtudes reais.

Os aposentos do rei e da rainha estão cada um do seu lado, os dele no Torreão Norte, os dela no Torreão Sul. A separa-los têm a Galeria da Frente, um enorme corredor com os tais 220 metros. É este corredor que constitui a longa fachada a amarelo, interrompida pelo branco da Basílica, que vemos do Terreiro D. João V, praça central do monumento. Lá do alto, na Sala da Benção do Piso Nobre, há uma varanda para o terreiro de onde o rei costumava saudar o seu povo. Para o interior, umas janelas abrem-se para a Basílica e permitem-nos vê-la por dentro e de uma posição elevada.

Este corredor que atravessa diversa salas é austero e imponente, com muito mármore e pedra lioz. Já as salas que se seguem aos aposentos da Rainha, passado o Torreão Sul, são delicadas e com a ostentação apenas necessária.

Temos a Sala da Música, ou Sala Amarela, onde nos dizem que eram recebidos os convidados e fica fácil imaginá-los entretidos a conviver e sentados no banco em forma de concha enquanto alguém tocava ao piano de cauda.

A Sala da Caça é um assombro. Assim, sem mais. É ir ver o significado da palavra “assombro” ao dicionário e escolher se o sentimento perante esta sala há de ser positivo ou negativo. Como não seguidora das teses fundamentalistas dos direitos dos animais, esta foi a sala que mais fantasia me proporcionou, toda ela preenchida com mobiliário elaborado com hastes e pele de animais vindos da Tapada, como gamos, veados e javalis, e com uma colecção de pratos e azulejos com cenas de caça, animais e flores.

Mas o deslumbre total fica guardado para o final do Piso Nobre. É lá que está uma das bibliotecas mais importantes do mundo e cuja beleza é presença assídua em todas as listas do género. Do século XVIII, a Biblioteca tem no seu acervo cerca de 36 mil volumes e dele constam exemplares únicos considerados obras-primas e raridades. Até mesmo livros proibidos à época pelo index da Igreja Católica, situação apenas possível pela autorização através de Bula Papal de Bento XV datada de 1754.

As capas seculares deste mar de livros preenchem as estantes em estilo rocaille com decorações visualmente exuberantes. O salão da biblioteca tem a forma de cruz, com 85 metros de comprimento e 9,5 metros de largura, e o pavimento é todo em mármore. Outra das curiosidades desta biblioteca é a sua colónia de morcegos que, inimiga das traças e amiga dos livros, os tem ajudado a conservar ao longo dos séculos. Felizmente que me pouparam ao susto do seu voo aquando da minha passagem pela biblioteca.

A antiga enfermaria do Convento fica no piso intermédio. Aqui se veem a Cozinha, a Botica e a Enfermaria dos Doentes Graves. A Botica era o lugar onde se preparavam e armazenavam os medicamentos feitos das ervas e raízes vindos da horta conventual ali mesmo ao lado. Quanto à Enfermaria destinada aos doentes graves, esta tem a particularidade de ter as camas viradas para o altar para que os doentes pudessem assistir à missa e por cima de cada uma das camas veem-se uns painéis em azulejo com imagens de Cristo e da Virgem Maria.

A visita à Basílica é outro dos pontos altos do Palácio e Convento de Mafra. Já a tínhamos visto desde cima, mas antes de a adentrarmos para a sentir verdadeiramente passamos pela sua entrada com uma galilé majestosa. São diversas as belas figuras escultóricas de santos e o seu tom azul divino.

A Basílica segue o estilo barroco italiano e é toda revestida a pedra lioz da região e a nobreza destes mármores cria um ambiente faustoso e cerimonioso. Tem forma de cruz latina e o seu zimbório, com 65 metros, foi a primeira cúpula construída em Portugal. Refira-se, ainda, a maravilha que são os seus dois carrilhões, actualmente em restauro, o maior complexo sineiro histórico mundial. A propósito de melodias, notícia recente deu-nos conta da confirmação da transferência do Museu Nacional da Música para o Palácio Nacional de Mafra.

O Jardim do Cerco fica colado ao Palácio e às dependências dos militares. Confina com a Tapada mas para a visitarmos há que pegar no carro e seguir uns quilómetros adiante.

A entrada no espaço verde murado da Tapada Nacional de Mafra faz-se pelo Portão do Codeçal e aqui podemos escolher um de vários percursos pedestres que percorrem parte dos cerca de 1187 hectares desta tapada. Seguimos pelo Percurso Amarelo, 8 kms de caminho fácil feitos em cerca de 2h 30m.

Ficamos no meio da natureza. Um pequeno curso de água, paisagem levemente acidentada, flora e fauna para descobrir. Por entre pinheiros, carvalhos e sobreiros, logo a meio da subida avistamos uns gamos ou veados (não veríamos nem os javalis nem as aves de rapina que fazem a fama deste espaço junto daqueles). Neste primeiro encontro a desconfiança é mútua. Queremos chegar perto para melhor os percebermos mas ao mesmo tempo não os queremos perturbar; da parte deles sente-se que não esperavam forasteiros tão cedo pela manhã.

A primeira parte do percurso é toda a subir. No ponto mais altaneiro admiramos a envolvente tranquila. Quando descemos vamos vendo algumas ruínas de antigos apoios à Real Tapada de Mafra, como um tanque de água e um forno de cal. Fundada no século XVIII como parte do conjunto do Palácio e Convento, era para aqui que a família real e seus convidados vinham passear e caçar, para além da Tapada servir igualmente de fornecedora de diversos produtos para o Palácio.

O Pavilhão da Caça do Rei D. Carlos lá permanece, recuperado em tons rosa. Por aqui se passeiam mais uns gamos e veados (cheguei ao fim do passeio sem os conseguir distinguir ao certo), agora mais habituados às visitas.

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