Aljustrel, no Baixo Alentejo, é povoação antiga, onde a história já existia antes da chegada dos romanos. Ocupada por povos diversos ao longo dos tempos, a memória da mina, ainda em funcionamento, é a marca mais presente. No entanto, a sua implantação geográfica é motivo de surpresa, uma vila instalada num vale entre duas colinas à volta da qual a planície reina soberana.

Não se sabe com certeza quando terá surgido Aljustrel, mas certo é que quando os romanos aqui chegaram já encontraram uma fortaleza, tendo romanizado o castro existente. No cimo de uma colina a 247 metros de altitude, o Cerro de Nossa Senhora do Castelo, restam hoje apenas troços das fundações do frágil e rudimentar castelo erguido em taipa pelos muçulmanos talvez no século 10 e logo abandonado após a conquista aos mouros do Algarve – no século 15 já estava em ruína. Foi a sua natural função de posto de observação que mais seduziu quem aqui se foi estabelecendo. A vista é soberba, deixando ver a imensa planície ocupada por campos de cereais com uma árvore aqui e outra ali.



No alto, lado a lado com um marco geodésico, está a Ermida de Nossa Senhora do Castelo, em cujo interior se vê num canto um afloramento rochoso. Diz a lenda que sobre esta rocha escura apareceu Nossa Senhora e que quando se decidiu construir a ermida não se incluiu esta pedra na estrutura, mas sempre que se iniciava a construção deixando-a de fora a igreja ruía. Só quando se decidiu construí-la usando a pedra como alicerce se conseguiu, enfim, aguentar de pé.

Desde o santuário descemos (ou subimos) por uma longa escadaria monumental rumo ao centro da vila. Conquistada aos mouros em 1225 pela Ordem Santiago de Espada, que assim recebeu a povoação por parte de D. Sancho II, Aljustrel não tem monumentos de monta. Possui, todavia, um centro compacto e com motivos que suscitam atenção.



A Igreja Paroquial do Santíssimo Salvador, em tons azul e branco e com torre sineira numa das laterais, é muito grande e a abóbora da nave é considerada a maior do Alentejo.

A Igreja da Misericórdia, pelo contrário, é de dimensão modesta e toda caiada de branco. Do século 16, a sua arquitectura é diferente da que estamos acostumados a ver, com uma mistura de estilos maneirista e manuelino e frontão com colunas toscanas, com a curiosidade de estar encaixada entre outros edifícios. Quase passa despercebida.


Várias esculturas prestam homenagem a temas queridos na região, como o Cante Alentejano (património cultural imaterial da humanidade), os resistentes anti-fascistas e o mineiro de Aljustrel. Não há como o evitar, a actividade mineira é incontornável a Aljustrel e já os nossos antepassados pré-históricos aqui extraiam cobre, estando comprovados registos desta actividade desde pelo menos 3000 a.C. (foram encontrados nas minas instrumentos rudimentares como frechas e machados de cobre): a nordeste fica a mina de São João do Deserto, uma corta a céu aberto em repouso desde há muito; e a sudeste fica a mina dos Algares, ainda em actividade, embora em muito menor escala em relação a outros tempos.

Situada na faixa piritosa ibérica, uma área com cerca de 250 kms de extensão entre Alcácer do Sal e Sevilha, abrangendo regiões como o Alentejo, o Algarve e a Andaluzia, é rica em cobre, zinco, chumbo, ferro, prata e ouro. Aljustrel era a antiga Vipasca dos romanos, então um dos grandes centros mineiros do império. Em 1876 foi encontrada na mina dos Algares umas placas em bronze que ficaram conhecidas como as Tábuas de Bronze de Vipasca, com a inscrição daquela que se crê ser a primeira legislação regulamentar da actividade mineira. O arqueólogo Estácio da Veiga publicou um estudo sobre este código, escrito em caracteres romanos e afixado em lugar público para que todos conhecessem as suas disposições. E Aljustrel era ainda a Al-lustre islâmica, designação que fará alusão ao brilho e à luz que as formações geológicas deixavam ver – e também os mouros fizeram uso da mina. Entre o final do século 19 e meados do século 20 foi um dos principais complexos mineiros do nosso país. Hoje, século 21, Aljustrel ainda vive da mina. Desde logo, a marca na paisagem é profunda. Os diversos sítios onde as pirites exploradas desde a antiguidade foram extraídas estão à vista a céu aberto e um circuito museológico neste Parque Mineiro de Aljustrel permite-nos perceber in loco a história da indústria que moldou a paisagem através das entranhas da terra esventrada e das instalações e equipamentos mineiros.



Com vista para a vila, uma perfuradora e um malacate (uma torre em ferro que servia de transporte vertical pelo poço da mina) antecipam a entrada no bairro mineiro de Val d’ Oca, um dos núcleos habitacionais criados para que os trabalhadores pudessem estar mais próximo da mina, este com a curiosidade de cada casa ter um pequeno quintal nas traseiras para fornecimento de alimentos. Entretanto, Aljustrel foi-se desenvolvendo urbanisticamente e estes bairros e a mina de Algares foram aproximando-se cada vez mais do centro histórico.



Junto ao bairro de Val d’ Oca fica a barragem de separação de águas (uma de rejeitados e outra de águas claras) e, do outro lado, o Chapéu de Ferro de Algares, um afloramento mineral geológico à superfície donde foi extraído o minério. Com cerca de 900 metros e 35 metros de largura, este afloramento foi intensamente explorado desde a época romana através de poços e galerias que chegaram a atingir 118 metros de profundidade. Um circuito por passadiços de madeira permite a visita à exploração mineira, com passagem quer pela Central de Compressores de Algares quer pelo Poço Romano, por entre uma parede rochosa escavada (ao ser aberto um caminho que corta o Chapéu de Ferro cortou-se também um poço romano que terá sido abandonado por não ser viável). A Central de Compressores de Algares foi construída em 1952 e fornecia a mina e é um elemento de arqueologia industrial que testemunha os processos de engenharia associados ao uso do ar comprimido como fonte de energia. As ferramentas de ar comprimido já aqui existiam desde os anos 1920, tendo sido gradualmente substituídas por equipamentos hidráulicos. O ar comprimido produzido era canalizado para as frentes de trabalho no fundo da mina mediante condutas e através dos diversos poços e galerias, activava as ferramentas e gerava iluminação para os mineiros.


O edifício do futuro centro de acolhimento que há de abrir (espera-se) em breve fará no futuro um melhor enquadramento do sítio. Por enquanto resta-nos a vista do seu terraço, que dá directamente para o imenso buraco da mina onde se distingue a Chaminé da Transtagana, a estrutura onde se procedia à queima do minério a céu aberto. Por vezes, visitas guiadas descem ao subsolo até às galerias da mina.

A par das minas, também a água foi importante em Aljustrel. As águas medicinais de São João do Desterro são conhecidas desde há muito e a nascente estava ligada à mina de mesmo nome, tendo sido utilizadas pelos romanos, árabes e, depois, portugueses. Chegaram a ser consideradas umas das mais ricas da Europa em arsénico, ideais para o tratamento e cura de doenças de pele. No século 20 foram construídas umas termas, abandonadas nos anos 1960 e hoje, ao que parece, ocupadas por ciganos que, aliás, é frequente ver passar nas suas carroças planície afora, uma marca evidente do carácter rural da povoação.