Finalmente, Angkor

E para o fim deste encadeamento de posts fica aquele que provavelmente terá sido o ponto mais esperado desta nossa ida ao oriente – o Parque Arqueológico de Angkor.
Angkor é tudo para o Cambodja. Mais do que um monumento, é toda uma herança, um símbolo, um orgulho, com direito a representação da sua imagem na bandeira oficial do país.
A base para se explorar os templos de Angkor dificilmente poderá deixar de ser Siem Reap, cidade sem muito apelo a não ser a sua localização a cerca de 6 km de Angkor Wat e o interessante significado do seu nome – “derrota do Sião” – em homenagem aos vizinhos rivais que tanto domínio foram exercendo em terras Khmer ao longo dos séculos. Para além disto, e para quem gosta (e eu não gosto), a cidade tem uma animada vida nocturna, cheia de restaurantes e bares da moda que poderiam estar de portas abertas em qualquer lugar cosmopolita do mundo.
A expectativa da visita a Angkor era muita, como já disse. Pensava que iria ficar deslumbrada – e fiquei –, mas pensava também que iria ficar farta de ver tanta pedra – e não fiquei.
E nem sequer imaginava que poderiam existir assim tantos templos (ou seja, pedras) para serem visitados.
É tudo muito mais do que apenas a imagem mais famosa de Angkor Wat.
São cerca de 200 km2 de monumentos prontinhos a ser visitados (alguns deles extraordinariamente bem conservados).

O império Khmer ia da Burma ao Vietname e chegou a ter 1 milhão de habitantes.
Angkor, a “cidade sagrada”, capital do império Khmer, é uma mescla da espiritualidade com a criatividade. Os poderosos reis fizeram por colocar em prática a sua megalomania artística para a dedicar às suas divindades preferidas. Sempre sob a influência indiana e, nomeadamente, de duas das suas religiões, primeiro a hindu, mais tarde a budista e, muitas das vezes, as duas ao mesmo tempo. Outras das inspirações Khmers foram os épicos hindus Ramayana e Mahabharata – excelentemente representados nos baixos-relevos de alguns templos e incrivelmente bem conservados até hoje.

Mais um pouco de história, então.
O período que se designa por angkoriano vai do ano 802 ao ano 1432. Jayavarman II, o primeiro rei e fundador de Angkor, começou a expansão do império Khmer depois de o ter unificado. Desde aí iniciou-se a construção dos vários templos dedicados às divindades, com Shiva e o seu lugar sagrado – o Monte Meru – à cabeça. Daí que muitos dos templos simbolizem representações desta mítica montanha. A ideia da arquitectura Khmer baseava-se, assim, no templo montanha, de preferência construído numa montanha verdadeira.
Outro dos aspectos que se verificaram desde logo e que perduraram foi a magnifica simetria dos elementos. Para além do equilíbrio, a elegância das construções era – e é – evidente.
Em 1177 os Chams saquearam Angkor, mas Jayavarman VII conseguiu dar a volta à situação e reergueu o império, desatando a construir mais e mais templos. Assim, a Angkor Wat acrescentou uma nova cidade, Angkor Thom, cercada por muros e um fosso de água, legando-nos monumentos fantásticos e misteriosos como Bayon, Ta Phrom, Banteay Kdei e Preah Kahn. E para além das divindades hindus adoptou o Mahayana Budismo, religião esta que já era seguida pelo povo. Com a sua morte em 1219 o império começou a entrar em decadência e voltou-se ao hindu como religião do estado.

Em 1351 os Thais saquearam Angkor e os Khmers saíram para Phnom Penh – a actual capital do reino do Camboja. Deixaram, assim, Angkor para os peregrinos e, principalmente, para a selva. Apenas Angkor Wat seguiu sendo utilizado como um mosteiro budista.
Angkor só voltou a ser “descoberta” por volta de 1860 pelos franceses. Nessa sequência o explorador Henri Mouhot escreveu um livro sobre a mítica Angkor que cativou o mundo. No entanto, antes, no século XVI já os portugueses – sempre os mesmos intrometidos – se haviam referido a esta cidade como a “cidade murada” e são tidos como os primeiros europeus a terem visto Angkor.Começaram então os trabalhos de restauro, com técnicas cada vez mais desenvolvidas e muita cooperação externa durante todo o século XX, os quais viriam a ser interrompidos pela acção trágica (para o país e o mundo) do Khmer Vermelho.
A partir dos anos 90 o sítio arqueológico voltou a ficar acessível para todo o mundo e com cada vez mais monumentos a estarem disponíveis à visita das multidões de turistas que aqui acorrem em cada vez maior número à medida que os anos vão passando. Encontram-se ainda alguns avisos de perigo de minas nos monumentos mais distantes do centro de Angkor, mas se nos mantermos no trilho tudo correrá pelo melhor.

E nem o escada a cima, escada abaixo sob o calor abrasivo nos faz delirar e rejeitar as pedras. Ou melhor, delírios só no bom sentido. É possível ficarmos quase um mês (houvesse férias para tal) a ver, observar e sentir os inúmeros e variados templos a cada hora do dia, aproveitando as muitas maravilhas que as diferenças de tonalidade de luz nos presenteiam.
Mas não. Ficámo-nos por 3 dias praticamente inteirinhos, com direito a nascer e por do sol (com as nuvens a atrapalhar aquele que tinha tudo para ser o momento mais inesquecível das nossas vidas – assim ficou apenas um dos) nesta autêntica cidade de edifícios, terraços, portas monumentais, avenidas e lagos, à qual nem sequer faltava um desenvolvido sistema hidráulico de reservatórios e canais destinados à agricultura.

Uma cidade que permaneceu protegida pela floresta e que hoje vê a floresta como uma das suas inimigas.
No fundo, “quod me nutrit me destruit” (o que me alimenta, destrói-me), nada mais, nada menos do que uma das frases que Angelina Jolie carrega numa tatuagem no seu corpo. Ops, a previsibilidade a atacar. Não consegui escrever um post sobre Angkor / Camboja sem falar de Angelina Jolie, provavelmente a star que mais terá contribuído para os colocar no mapa do imaginário popular depois do templo de Ta Phrom ter servido de cenário para Tomb Raider.

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