Baburnama

O livro de Babur, escrito por este que foi o primeiro imperador mogol, é uma das primeiras autobiografias do mundo muçulmano, algo nada habitual no século XVI. O império Mogol começou por se constituir claramente como um estado guerreiro, de conquista e pilhagem, e Babur não podia deixar de nos relatar as suas vitórias e a vida em acampamento, sempre de um lado para o outro.

O livro tem três capítulos: O primeiro, dedicado a Fergana e Transoxiana, hoje Uzebequistão, onde Babur nasceu e lugar, em especial Samarcanda, com que havia de sonhar toda a vida. Aí, aos 12 anos, tornou-se rei; O segundo, dedicado a Cabul, terra que conquistou para si e lugar de onde haveria de lançar diversos raids ao território indiano antes de o tomar; O terceiro, dedicado ao Hindustão. A conquista do Hindustão deu-se após várias incursões pelo noroeste da Índia e no seu livro Babur descreve as batalhas que travou contra os afegãos e os rajputs. Fala da diferença de meios (os afegãos possuíam 1000 elefantes e muitos mais homens) e deixa claro o seu talento de grande estratega.

Todavia, longe de ser um livro de guerra e de descrição de preparativos para batalhas, este é um livro emocional e cândido. Babur fala na viragem que a sua vida levou após a batalha contra os rajputs, os infiéis, em que passou a colocar mais ênfase no islão e optou pela temperança, ao mesmo tempo que nos dá conta do difícil que foi deixar a bebida. Isto no final da sua vida. Antes, porém, descreve a falta de interesse no seu primeiro casamento ao mesmo tempo que nos conta do seu primeiro amor – um rapaz do mercado cujo encantamento o leva a escrever uns versos. Tudo, ou quase tudo, servia de pretexto para a poesia. Em verso escreve também que “para além da minha alma eu nunca encontrei um amigo, para além do meu coração eu nunca encontrei um confidente”, o que evidencia a solidão que sentia. Aponta a diferença de pronúncia dos indianos, dizendo que estes deixam cair algumas vogais. Conta das suas caçadas e das suas festas, regadas a álcool e acompanhadas do consumo de narcóticos, que também usava para combater as suas insistentes dores. À medida que se vai aproximando do Hindustão vai registando as “diferentes maneiras, diferentes costumes”. Descreve os seus animais, plantas e frutos, bem como o “excelente” sistema de numeração e pesos.

Mas constantemente refere ser o Hindustão um lugar de pouco encanto, sem beleza nas suas gentes, sem harmonia ou simetria no seu artesanato, com cidades desagradáveis. Sonha com a sua terra natal, em especial com os seus melões. Apenas uma boa coisa considera existir na Índia: muito ouro e dinheiro, ou seja, muita riqueza para pilhar.

Pese embora o saudosismo que marca o final do livro, escrito cronologicamente, a cada passo surge uma poesia, um momento de reflexão ou tão somente o relato de uma actividade do imperador conquistador: “Eu atravessei o Ganges a nadar. Contei as braçadas que me levou a atravessá-lo: 33. Então, sem descansar para respirar, atravessei de volta para o outro lado. Eu nadei todos os rios – só o Ganges restava.”.

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