A Praça das Amoreiras é um jardim rodeado por edifícios setecentistas, incluindo a monumental arcaria parte integrante do troço final do Aqueduto das Águas Livres. Agora numa zona central e abastada de Lisboa, este lugar aconchegante tem uma origem curiosa.

Em 1741 estava concluída a Real Fábrica das Sedas, edifício ainda presente no Largo do Rato, um pouco abaixo desta Praça. O Rato era então um subúrbio de Lisboa e havia sido escolhido como zona de expansão urbanística que fosse ao encontro das necessidades das unidades de indústria que aqui se pretendiam instalar. Nessa sequência, foi construído um bairro para os fabricantes artesãos e seus aprendizes ao redor da que hoje conhecemos como Praça das Amoreiras. Para fornecimento de material para a fábrica, em 1771 foi aqui plantado um jardim de amoreiras e assim surgiu o nome do que começou por ser apenas um jardim e hoje dá nome a todo um bairro.



O jardim é tranquilo, com um típico quiosque verde e um pequeno lago com fonte ao centro, muitas árvores e alguns caminhos a envolverem os canteiros de plantas. Lê-se no volume dedicado a Lisboa do Guia de Portugal, publicado em 1924, ser este um jardim “com um ar provinciano que o distingue de todos os outros da capital. Tílias, robínias, e no meio da placa ajardinada uma tamareira cercada de flores”. Estes elementos mantém-se, pelo que só podemos esboçar um sorriso ao ver hoje as palavras “Amoreiras” e “provinciano” na mesma sentença.

E o que se mantém igualmente é a Fábrica de Tecidos de Seda, um dos edifícios pombalinos do conjunto urbanístico desenvolvido à boleia da implementação da Real Fábrica das Sedas. Em 1990 foi transformado em sede da Fundação Arpad Szenes – Vieira da Silva e é o gosto em admirar as obras da metade portuguesa desta dupla de artistas que me faz voltar repetidamente à Praça.

Mas o elemento arquitectónico de maior preponderância na Praça das Amoreiras e que a torna senhora de uma beleza cénica sem igual é o troço do aqueduto que a atravessa, parte do sistema do Aqueduto das Águas Livres. Para lá do arvoredo, dividindo a Praça das Amoreiras da Rua das Amoreiras, assiste-se ao desfilar da arcaria monumental do aqueduto. São 10 arcos de volta redonda, incluindo o arco triunfal dórico deste troço final do Aqueduto das Águas Livres. Para fechar em beleza não foram poupados esforços e a imponência é manifesta. Entre esta arcaria, aninhada no vão do arco do meio percebemos a existência de uma ermida. É a Capela de Nossa Senhora de Monserrate, mandada construir (posteriormente) pela irmandade dos fabricantes de seda.

O Aqueduto das Águas Livres, uma das maiores obras de engenharia do nosso país e marco essencial na história do abastecimento de água à cidade de Lisboa, foi mandado construir por D. João V em 1731 e tem como seu troço mais emblemático a arcaria sobre o vale de Alcântara. É a sua imagem maior, indisputável, mas se há troço com possibilidade de o secundar em beleza e grandeza, o das Amoreiras é um deles. Ainda para mais, aqui fica o Reservatório da Mãe de Água, projectado em 1746 pelo arquitecto húngaro Carlos Mardel, cuja construção ficou concluída apenas em 1834. O grandioso edifício quadrangular, com apontamentos artísticos na fachada, como as gárgulas na cornija, são o remate perfeito enquanto estrutura terminal do Aqueduto das Águas Livres.

O Reservatório hoje classificado, como Monumento Nacional, chegou a ser palco dos festejos do casamento entre D. Luís e D. Maria Pia, em 1862. Mas o objectivo primordial da sua construção foi o de celebrar a entrada da água em Lisboa, a qual após o transporte pelo Aqueduto das Águas Livres era aqui recebida e distribuída, sendo depois conduzida através de uma rede de cinco galerias que abastecia os chafarizes da cidade e alguns estabelecimentos públicos, como hospitais, conventos e casas nobres. Parte do troço subterrâneo de uma dessas galerias, a Galeria do Loreto, pode ser visitada através de marcação prévia junto do Museu da Água.


Já quanto ao Reservatório da Mãe de Água das Amoreiras não dizemos que “pode”, mas antes que “deve” ser visitado. Igualmente parte integrante do Museu da Água, pertencente à EPAL, a sua visita é uma das maiores surpresas da cidade de Lisboa. O interior do tal edifício de fachada grandiosa consegue ser igualmente majestoso. A cisterna de água, um tanque de 28,6m por 24,4m, com capacidade para 5500 m3, está envolvida por colunas e um tecto abobadado. O ambiente é austero, quase de catedral, com uma acústica fantástica que percebemos pelo som da queda de uma gota de água aqui ou ali. Para completar este cenário já de si perfeito, vemos ainda uma cascata com motivos vegetalistas e água a cair da boca de um golfinho.

Mas a visita ao Reservatório da Mãe de Água não termina aqui. Subimos a escadaria, espreitamos para a galeria interior da arcaria do troço das Amoreiras e chegamos ao terraço panorâmico deste enorme edifício. Tínhamos referido de início, estamos hoje no centro de Lisboa e é a cidade capital que agora assume o papel de protagonista.

A vista deste miradouro pouco conhecido é ampla e fabulosa. Mais uma entre tantas desculpas para se visitar a Praça das Amoreiras.