Parque Natural do Alvão

O ano passado subi ao Castelo de Pena de Aguiar, concelho Vila Pouca de Aguiar, perto de Vila Real. Para além do castelo e sua implantação terem sido uma deliciosa surpresa, a vista do seu alto impressionou. Desde aí a visita ao Parque Natural do Alvão passou a ser um objectivo.

Frustrantemente cumprido agora.

O clima do último dia de Maio não jogou a favor e grande parte da jornada pelo Alvão foi efectuada sob chuva e intenso nevoeiro. Resultado? A aldeia de Lamas de Olo foi percorrida mas não vislumbrada e as vizinhas barragens Cimeira e Fundeira, planalto com, diz-se, vistas privilegiadas para os cumes do Alvão e do Marvão, nem sequer percebidas. As Fisgas do Ermelo, a maior queda de água de Portugal e uma das maiores da Europa, apenas foi (bem) apreciada ao longe de um dos seus miradouros e a obrigatória caminhada pelas cascatas que se reproduzem e caem em vários desníveis, formando algumas piscinas, como as Piocas de Cima e de Baixo, teve de ser adiada.

Serve esta introdução para dizer que muito mais há para explorar e viver no Alvão. E serve o desenvolvimento que se segue para mostrar que, ainda assim, o aperitivo soube a prato principal.

O Parque Natural do Alvão fica situado no distrito de Vila Real, com território quer no concelho de mesmo nome como no de Mondim de Basto. Para lá chegarmos ou ladeamos a Serra do Marão (se tomarmos a estrada nacional) ou a cortamos e adentramos (se optarmos pela auto-estrada), seguindo pelo Túnel do Marão, uma obra de engenharia com dois anos que fez deste túnel entre Amarante e Vila Real o mais longo do nosso país, com 5825 metros.

E assim entramos no Alvão pelo verdejante e fértil vale da Campeã e tomamos a N304, considerada uma das estradas mais bonitas de Portugal.

É de paisagens de que se trata o Parque Natural do Alvão e nem o mau tempo nos impede de o confirmar. Uma das características do Alvão é o facto da variação da sua altitude, o seu relevo e o seu coberto vegetal criarem um certo microclima. Tão depressa passamos dos 18º aos 10°, como de um raio de sol a uma chuvada inclemente. A flora e a fauna aproveitam-se deste factor e a sua riqueza e diversidade é evidente: no Alvão estão inventariadas cerca de 486 espécies de plantas e 200 espécies de animais. Não vimos o lobo ibérico nem a águia real, mas o famoso gado maronês que vegeta nos lameiros e a cabra bravia disseram alô, sendo o sector pecuário uma das economias da região. Na beira das estradas veem-se amiúde pastores guiando os seus animais pelas paisagens cativantes do Alvão.

Zona de granito onde o xisto é também presença constante, junto às suas paredes rochosas brotam urzes e carquejas, formando um conjunto colorido de amarelo e rosa sobre um fundo escuro. Mas é o verde a cor dominante. Dos carvalhos, mas também dos sobreiros, castanheiros e loureiros e vegetação diversa.

Outros dois elementos fazem do Alvão uma região inesquecível: as suas aldeias e o rio Olo.

Quanto às aldeias, isoladas entre si e quase que perdidas na montanha, Lamas de Olo foi atravessada sem se ver graças ao nevoeiro cerrado, Barreiro escapou totalmente, mas Ermelo serviu de exemplo.

Lamas de Olo fica no alto da Serra do Alvão, já bem perto do seu ponto mais elevado, o Alto das Caravelas a 1330 metros de altitude. É uma pequena povoação com casas vetustas com telhados de colmo e muros de granito.

Já na aldeia de Ermelo é o xisto que domina. A arquitectura tradicional formada pelo casario em xisto, igreja e pelourinho vale a pena ser visitada nesta aldeia que se diz ser tão antiga como o reino de Portugal. Espigueiros lado a lado com a cruz, casas incrivelmente empoleiradas, uma levada que transporta a água em que por pouco não deixei cair uma das rodas do carro, a natureza conferiu os materiais que os locais desde sempre se habituaram a utilizar na construção dos edifícios e dos equipamentos das suas povoações. A rocha está presente em todas elas, seja granito ou xisto, e faz da arquitectura rural do Alvão um interesse por si só.

Ermelo é também o local onde podemos caminhar até ao Rio Olo e daí seguir um trilho para Piocas de Baixo e para as Fisgas. Não fizemos este trilho mais longo, desta vez, e seguimos apenas por uns 15 / 20 minutos de arvoredo e vinhas até um pedaço do Olo onde encontramos a pitoresca ponte da Abelheira e uns coloridos pompons disfarçados de vegetação e acompanhados por umas formosas pedras.

O rio Olo é uma das riquezas do Alvão. Nasce a 1280 metros de altitude e vai correndo até desaguar no Tâmega. Em diversos pontos se pode banhar nas suas águas límpidas onde abunda a truta. As Piocas serão os mais bonitos. Mas as Fisgas do Ermelo são o fenómeno natural mais emblemático de todo o Alvão.

O miradouro a que se acede desde o Fojo, num caminho de estrada com paisagens e cores belíssimas das giestas, deixa-nos frente mas longe desta sucessão de cascatas. O lugar é tão imenso que esmaga. Um enorme e profundo desfiladeiro, não aconselhado a quem sofra de vertigens, separa-nos da montanha onde vemos o rio Olo a romper a rocha e despenhar-se desde os 800 metros de altitude, formando cascatas em diversos patamares, a mais alta delas com 50 metros – a que podemos observar desde este miradouro. A palavra “fisgas” é sinónimo de “fenda”, e é precisamente uma fenda aberta na rocha que nos permite este cenário fantástico da água do Olo.

Sobre as Fisgas, escreveu Miguel Torga, homem da terra (São Martinho da Anta, Vila Real), em 1959:

“Cá me vim debruçar também sobre o despenhadeiro das Fisgas, com os pés seguros pelos companheiros por causa das vertigens. E apreciei devidamente este misto de espanto e terror. A contemplação dos abismos naturais é necessária de vez em quando a quem tem a atracção dos outros. Toma-se consciência, com rigor físico, das asas que nos faltam para estar à altura da máxima de Nietzsche…”

Outros cursos de água marcam presença no Parque e possuem igualmente uma poderosa imagem materializada em cascatas.

A cascata do Bilhó, rio Cabrão, fica mesmo à beira da estrada e daí vemos uns fios de água a descer pacatamente numa vertente verde cheia de pedras.

Já a cascata de Galegos da Serra corre mais apressada num vale com um enquadramento paisagístico soberbo. Vê-se já aqui o caos granítico que caracteriza a região Muas / Arnal, um pouco mais acima. As rochas parecem ter sido aqui colocadas de propósito para abrilhantar o cenário de intensa vegetação verde onde saltam também tons de violeta e amarelo. Entre Agarez e Arnal, a água desta cascata de Galegos da Serra vem caminhando lentamente de longe, pertencente à Ribeira do Arnal, até se precipitar e cair numa pequena piscina natural. Depois continua o seu caminho lentamente por entre as pedras e chega a ter como vizinho uns bonitos socalcos.

Aqui perto fica Relva e outras pequenas aldeias que parecem perdidas na serra. Esta, em especial, possui umas vistas largas para Vila Real e assim percebemos que estamos prestes a deixar o Parque Natural do Alvão, sua natureza e ruralidade. Um até já.

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