Os Templos de Luxor

Luxor foi capital do Egipto durante o Império Médio e Império Novo (2055 a 1069 a.C., entre a 11ª e a 20ª dinastias). Entre templos e túmulos a abundância é tal que um terço de todos os monumentos antigos do mundo estão neste lugar dividido pelas duas margens do rio Nilo – revelador da sua importância e magnificência ao longo de milénios, a casa dos faraós mais populares da história.

Os egípcios chamavam-lhe Waset e os gregos Tebas, nome ainda hoje usado. Tebas significava algo como “as cem portas”, por referência ao grande número de pilones (portas) dos seus templos. Já os árabes, quando chegaram para conquistar o Egipto, confundiram os templos com palácios e deram-lhe o nome de Luxor, palavra derivada de al-Uqsur, de significado “palácio”. Na lista de Património da Humanidade da Unesco desde 1979, na margem ocidental fica uma série de incríveis templos mortuários e túmulos, o Vale dos Reis protegido pelas áridas montanhas do deserto, enquanto que na margem oriental se foi desenvolvendo a cidade moderna ao redor de templos fabulosos como o de Karnak e de Luxor. É por eles que começaremos.

A religião egípcia assentava no culto dos deuses, e não na crença. Para isso, os antigos egípcios construíram diversos templos, acreditando que os deuses, tal como os seres humanos, necessitavam de uma casa. O Templo de Karnak foi, assim, construído para servir de residência a Amun, o rei dos deuses, o mais proeminente deus de Tebas, mas também de outros deuses locais. Os antigos egípcios chamavam-lhe “Ipet Sut” – “o mais selecto de todos os lugares” -, construídos e desenvolvidos ao longo de 1500 anos, o que faz da visita ao Templo de Karnak uma viagem pela história e arquitectura do Antigo Egipto.

O mais importante lugar de culto durante do Império Novo é igualmente um dos maiores complexos religiosos do mundo. São 2 kms2 que acolhem um conjunto majestoso de templos, santuários, quiosques, pilones, obeliscos e estátuas. É um espaço tão grande que nele é possível colocar 10 catedrais e ainda haver folga para mais.

É dedicado ao culto de Amun – no centro de Karnak está o Grande Templo de Amun – e da tríade tebana – Montu (o deus da guerra de Tebas), Mut (a mulher de Amun) e Khonsu (seu filho) -, mas também acolhe os templos dos reis Tutmosis III, Amenhotep II, Tutmosis IV, Ramses II e Ramses III. Ou seja, é igualmente um testemunho da glória e do poder dos faraós.

O plano do Templo de Karnak obedece ao de outros templos do Antigo Egipto, mas aqui tudo é ainda mais elevado a um grau de excelência sem limites. Uma passarela ladeada de estátuas de cabeça de Ram antecede o primeiro pilone, construído por Nectanebo durante a 30ª dinastia, mas nunca concluído.

À esquerda estão as Capelas de Seti I, para barcas sagradas, e à direita o Templo de Ramses III, que servia as grandes procissões anuais como o Festival Opet, e no meio o Quiosque de Taharqa com a colunada Bubastite, que já foi pátio coberto. Destes, no Templo de Ramses III encontramos uns relevos muito bonitos e expressivos nas colunas com motivos centrais à arte e religião egípcia daquela época, como este acto de oferecer o ankh, símbolo da vida.

Até aí, uma boa introdução para o que vem a seguir. E o que vem a seguir, entre o segundo pilone, construído por Horemheb (o qual se tornou a entrada do Templo), e o terceiro pilone, é apenas das coisas mais belas e maravilhosas que podemos conhecer. No Egipto ou no mundo. A Grande Sala Hipostila é uma floresta lítica (pedra) que pretendia imitar o pântano de papiros primitivo onde a vida teve a sua origem. Concebido por Seti I como um templo separado, era conhecido como o “templo de milhões de anos”, o lugar onde o culto real associado ao culto de Amun era celebrado. É um espaço com 103 metros de largura por 53 metros de comprimento, com um total de 134 colunas com 15-21 metros de altura. A nave principal tem duas filas com 12 colunas centrais, as mais altas, todas com as flores de papiro com os botões abertos, ao passo que as outras 122 colunas das alas laterais têm as flores de papiro com os botões fechados. A escala impressiona e sentimo-nos mesmo numa floresta de pedra encantada. E impressiona, igualmente, constatar como depois de tantos milénios resiste a cor viva dos relevos na decoração das colunas.

Depois da Grande Sala Hipostila segue-se novo pilone, o terceiro, acrescentado por Amenhotep III para servir de nova entrada monumental. Já vínhamos a perceber há um tempo que um obelisco espreitava. O Obelisco de Tutmosis I e o de Obelisco de Hatchepsut, este o mais alto do Egipto, com 30 metros, resistem como elementos únicos do par original – eram sempre aos pares. Do grego “obelisko”, de significado “espeto” em alusão à sua forma delgada e alongada, os egípcios chamavam-lhes “tekhen”. Estes enormes pilares de pedra, normalmente em granito, tinham 4 faces com inscrições (cenas e hieróglifos) e são mais estreitos em cima, terminando em forma piramidal que reflectia os raios de sol, símbolo da colina primordial onde o Deus do Sol Amun-Ra deu origem a tudo o que existe. Os obeliscos eram, por isso, erigidos pelos faraós em honra deste deus.

À direita, no pátio Cachette, em 1903 foram descobertas dezenas de milhares de estátuas em pedra e bronze, de reis e sacerdotes, a maior parte hoje em exposição no Museu Egípcio, no Cairo, mas também no Museu de Luxor. Estas peças acabaram por constituir uma extraordinária fonte de informação sobre a evolução dos rituais em Karnak, permitindo-nos imaginar um pouco da vida do sítio na época antiga.

O quarto pilone marca a entrada no santuário de Amun e para lá dele desenvolve-se uma série de elementos, como os referidos obeliscos, relevos nos muros, colunas, esculturas, pátios, num emaranhado de pedras cheias de história que nos faz dar vivas à arqueologia. Entre eles, uma estátua de Tutankhamon como Amun.

O Templo de Tutmosis III (Grande Sala do Festival), para lá do Pátio do Império Médio, tem mais colunas cheias de cor. E para lá dele fica ainda o Templo de Ramses II e a Capela de Osiris.

De volta, eis o Lago Sagrado. Era aqui o lugar onde os sacerdotes se purificavam antes de procederem aos rituais no interior dos templos e onde as barcas sagradas navegavam durante as cerimónias religiosas. A ideia era que servisse de contacto directo com Noun, o primitivo oceano donde toda a vida teve origem. Este lago já vinha do tempo dos reinados de Hatchepsut e de Tutmosis III, mas a sua actual forma data da 25ª dinastia, uma forma rectangular e 200 metros de comprimento por 117 metros de largura.

Mas há mais pilones neste complexo de Karnak, e nesta altura já quase lhes perdemos a conta, 7, 8, 9, 10. A visita a Karnak é coisa para durar umas boas 3 horas e por “sorte” tocou-nos estar encerrado o acesso ao Templo de Amenhotep II e o que vai para além, como o Templo de Khonsu (assim como fechado nos pareceu estar o templo de Montu e o de Opet, tendo optado por não visitar o Museu ao Ar Livre). Era daqui que saia a Avenida das Esfinges, um caminho processional que ligava o Templo de Karnak ao Templo de Luxor. Este caminho tinha 2700 metros de comprimento e 76 metros de largura e era ladeado por 1060 estátuas de Rams, Criosphinxes, Androsphinxes. Trabalhos de recuperação e restauro estão a ser levados a efeito, e nem conseguimos imaginar a maravilha que será, no futuro, poder percorrer por inteiro este caminho há milénios percorrido pelos antigos egípcios nas suas celebrações e rituais.

De Karnak ao centro de Luxor, onde fica o templo de mesmo nome, são cerca de 3 kms de táxi. Já dentro do recinto do Templo de Luxor, mas antes de entrarmos pela sua porta monumental, espreitámos e caminhámos uns poucos metros pela Avenida das Esfinges, com a barca real do deus Amun-Ra.

Também conhecido como Opet do Sul, o Templo de Luxor é um dos raros lugares no Egipto com devoção contínua desde pelo menos 2000 a.C. e é sobretudo obra de dois reis, Amenhotep III (1391-1353 a.C.) e Ramses II (1290-1224 a.C.). Como muitos dos templos egípcios, o de Luxor cresceu de trás para a frente e é por isso que a grande entrada monumental foi construída mais tarde, por Ramsés II. Destaque imediato para o seu obelisco, que a antecede. Já só resta um obelisco, uma vez que o outro foi oferecido a França, em 1831, e hoje está na Praça da Concórdia, em Paris. Estes ícones da arquitectura do Antigo Egipto despertaram muita curiosidade e admiração ao longo dos tempos por todos aqueles não egípcios que os encaravam. É sabido que o Imperador Augusto trouxe para Roma alguns destes símbolos que representavam a conquista do Egipto, mas o primeiro a ter ficado encantado por estas estruturas grandiosas terá sido o rei assírio Asurbanipal que, depois de saquear Tebas no ano 664 a.C., fez transportar dois obeliscos para o seu palácio real de Ninive.

Os dois grandioso pilones que servem de entrada ao Templo tem 6 estátuas colossais de Ramsés II, as guardiãs do Templo de Luxor. E estes pilones têm uma representação tri-dimensional do hieróglifo akhet, as montanhas no horizonte, por entre as quais o sol nasce e se põe todos os dia, bem como cenas de Ramses II na batalha de Kadesh contra sírios e outra contra hititas.

O Grande Pátio de Ramsés II que se segue é mais uma beleza, com colunas de papiro que formam uma unidade de excelência. Mas a surpresa vem ainda do facto de aqui conviver em plena harmonia uma arquitetura complemente diversa, a da Mesquita Abu El-Haggag, construída sobre uma igreja copta do século VI.

Depois vem a Grande Colunada de Amenhotep III, uma entrada gigantesca de 50 metros de comprimento suportada por duas filas de colunas de papiro abertas, (mais) uma maravilha que alcança os 21 metros de altura.

No início do caminho, tanto à esquerda como à direita, vemos duas estátuas de Tutankhamon como Amun-Ra, acompanhado de sua mulher Mut. Uma vez que este espaço havia ficado por completar à data da morte de Amenhotep III, foi Tutankhamon que o acabou por completar, apesar de também ter morrido antes de toda a decoração estar completa. Já as estátuas de Amenhotep III, como muitas outras obras de arte, podem ser vistas no Museu de Luxor. Amenhotep III havia sido o primeiro responsável pela construção do Templo de Luxor, mas Ramses II apagou o seu nome nas estátuas e substituiu-o pelo seu.

Também os romanos tiveram intervenção neste Templo, convertendo-o num monumento romano, ligando o antigo culto de Amun ao culto do imperador romano, cuja autoridade vinha do deus Júpiter – e aqui vêem-se pinturas de frescos romanos mostrando quatro imperadores romanos.

E, claro, ainda falta a visita ao Santuário, onde eram deixadas as oferendas e, por isso, nos muros vemos várias cenas com essa representação. Incluindo Alexandre, o Grande representado como faraó (o seu nome está escrito no cartucho) em oferendas aos deuses – outra das enormes surpresas deste Templo de Luxor.

Era neste Santuário que permanecia o modelo da barca real que transportava o deus Amun-Ra vindo de Karnak durante o Festival Opet, e que agora está no início da Avenida das Esfinges deste Templo de Luxor.

O Templo de Luxor pode ser visitado a qualquer hora do dia, mas é ao final da tarde, com o pôr-do-sol, que as suas cores ganham outra vida e encanto. Espere-se, por isso, multidões como companhia na visita.

Na cidade de Luxor, vale a pena caminhar pela corniche e admirar o rio Nilo e as montanhas na margem ocidental, um cenário sempre exótico.

O Museu de Luxor fica junto a ela e a curta distância do Templo de Luxor. E não é apenas mais um museu de arte egípcia, mas um dos melhores. Relativamente pequeno (para os padrões egípcios), quando o visitámos já estávamos mais familiarizadas com a história e a arte do Antigo Egipto, pelo que foi como se estivéssemos a ver as fotos de antigos primos: “olha, lá está a destemida pioneira Hatchepsut”, “que mauzão, este carrasco do Tutmosis III”, “arrogante o Akhenaton, não?”, “tão novinho que era o Tut”. Por entre uma colecção de artefactos desde a pré-história, com enfoque especial no Império Novo, os objectos em exposição representam a glória de Tebas até à era islâmica.

Eis alguns destaques:

⁃ Duas Colossais Cabeças de Amenhotep III, descobertas no seu templo funerário na margem ocidental de Luxor. Numa das cabeças, em granito vermelho, com 124 cm de altura, usa a coroa branca do Alto Egipto, e na outra cabeça, em quartzito, também com 124 cm altura, usa a coroa vermelha do Baixo Egipto;

⁃ Estátua em calcário do Deus Amun, aqui representado com o rosto do rei Tutankhamon, em cujo reinado a escultura foi feita. Karnak, Império Novo;

⁃ Estátua de Mentuhotep, em granito, antes de se tornar vizir, representado sentado de pernas cruzadas na tradicional posição de escriba, preparando-se para escrever. Karnak, Império Médio;

⁃ Estátua de Amenemhat III em pé, em granito preto. Karnak, Império Médio;

⁃ Esfinge em calcite apresentando oferendas, parece a face de Tutankhamon (olhos e queixo). Karnak, Império Novo;

⁃ Estátua em alabastro do Deus Sobek em forma de crocodilo com o rei Amenhotep III. Dahmasha, Império Novo;

⁃ Relevo do Deus Amun-Min. Mostra Deus Amun misturado com deusa Min da fertilidade. Calcário. Deir el-Bahari, Império Novo;

⁃ Estátua em arenito de Nebre, comandante da fortaleza de Zawiet um el-Rakhem (Mersa Matruh), onde foi encontrada, construída para proteger a fronteira ocidental do Egipto dos líbios no tempo de Ramses II. Em uma das mãos segura uma espécie de ceptro com cabeça de Sekhmef, a deusa da guerra com cabeça de leão. Elegância e magnetismo puros. 19ª dinastia, Império Novo;

⁃ Estátua em granito cinzento do escriba Amenhotep, filho de Hapu, importante oficial durante o reinado de Amenhotep III. Karnak, 18ª dinastia, Império Novo;

⁃ Rei Akhenaton usando a dupla coroa do Alto e Baixo Egipto. Arenito. Karnak, Império Novo.

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