Esta proposta é uma curta incursão pelo extenso Barrocal Algarvio, a região que de forma natural faz a transição entre a serra e o mar. O mar do Algarve todos conhecem: de Sagres a Vila Real de Santo António é uma faixa de Atlântico com quase 200 kms. Quanto à serra, são na verdade duas as serras algarvias: Monchique e Caldeirão.

É uma longa faixa esta que se espreme entre estes dois elementos, com localidades como Silves, Paderne, Loulé e São Brás de Alportel como atracção. No entanto, neste desvio final da nossa jornada pela EN2 começámos por espreitar o ambiente do Barrocal desde o Miradouro do Alto da Arroteia, em São Brás de Alportel, e vagueamos depois pelo coração de Loulé.

A Fonte Benémola é uma Área de Paisagem Protegida entre Querença e Tôr, duas aldeias algarvias. Para lá chegar percorremos estradas completamente envolvidas na natureza e este lugar ainda o está mais. Por um percurso pedestre com 4 kms bem definidos, cerca de uma hora de caminhada, passeamos por trilhos de terra batida que aliam uma paisagem natural a alguns elementos rurais hoje abandonados ao longo de um vale atravessado por uma linha ribeirinha. A fertilidade dos terrenos agrícolas da várzea fez com que chegassem a ser 30 as pessoas a viverem neste lugar, abandonado na década de 70 e 80 do século passado. Plantava-se milho, batata, couve, melancia e melões e vinha gente de fora tratar das hortas. Hoje restam algumas casas de apoio, fornos de cal, lagar de azeite e infra-estruturas hidráulicas para aproveitamento da água (como levada, moinho de água e nora). A vegetação, agora que o vale deixou de ser cultivado, é abundante e típica do Barrocal, com sobreiros e azinheiras. Junto à ribeira o ambiente é também tipicamente ripícola, com salgueiros, freixos e loendros. Mas nesta paisagem é a água o elemento mais importante.


A Ribeira da Benémola é uma das poucas do Algarve que mantém água durante todo o ano, sendo abastecida por nascentes como O Olho e a Fonte Benémola. Caminhamos durante um bom bocado ao lado dela e vemos açudes que retêm a água e criam espelhos de água. É um lugar tranquilo. Pena que a sua água, que em tempos era reconhecida pelas suas propriedades medicinais, esteja hoje contaminada e imprópria para consumo humano.


Na zona da Fonte Benémola existe um parque de merendas e aqui regressamos ao ponto inicial mas agora pela outra margem. Por momentos o caminho segue numa espécie de túnel, com a vegetação ribeirinha a cobrir-nos, e deixa de se sentir o calor. Diz que este é um espaço privilegiado para observação de aves, mas infelizmente não as avistamos, apenas as ouvimos.

Após a caminhada pela Fonte Bénemola passámos por Querença, aldeia de casario alvo envolvido no verde da paisagem, e seguimos para Salir. Salir tem uma situação geográfica fantástica, instalada no alto de um monte por onde se espraia de forma alongada o seu casario branco. A toda a volta, tudo verde. Habitada desde há muitos séculos, os mouros construíram aqui um castelo que hoje se encontra em ruínas.
Esta é uma zona agrícola, conhecida pelas amendoeiras, figueiras, alfarrobeiras, oliveiras e medronheiros. Estes pomares mistos são possíveis graças às terras argilosas e férteis do Barrocal.

Aqui perto fica a Rocha da Pena, Área de Paisagem Protegida, à semelhança da Benémola. É um belíssimo afloramento rochoso que se avista desde longe, uma espécie de parede calcária. Da aldeia da Penina tem início um percurso pedestre circular de 6,7 kms. Embora a vontade fosse muita, o enorme calor que se fazia sentir aquando do nosso passeio tornou insensato que o percorrêssemos na sua totalidade. Assim, a conselho de um simpático local, invertemos a direcção sugerida pelo percurso pedestre oficial e subimos aldeia afora apenas até ao miradouro sul, a pouco mais de 1,2 kms de distância.


A aldeia é pitoresca, mais uma vez instalada na encosta. O caminho não é difícil se for percorrido com atenção – muita pedra solta – e com calma – sobe bem. A paisagem, pontuada por azinheiros e zimbro, vai ficando melhor e melhor.



O Talefe é o ponto mais alto da Rocha da Pena, a 479m. Daqui a nossa vista tudo alcança, Serra do Caldeirão nas costas, mar em frente, Salir à esquerda, Benafim abaixo, Serra de Monchique à direita. É quase todo o Barrocal de Loulé debaixo de olho. Cenário grandioso à parte, a própria Rocha da Pena é de uma singularidade estonteante, uma parede calcária verdadeiramente elegante. Ficámos com pena de não continuarmos o percurso.

Daqui seguimos para Alte, a aldeia que faz parte de qualquer lista de aldeias mais bonitas de Portugal. Aliás, já foi mesmo oficialmente considerada a mais típica do nosso país e é talvez a aldeia mais referida do Barrocal e uma das mais queridas de todo o Algarve. Entre a Serra e o Barrocal, apesar do relativo isolamento geográfico mantém a sua aura e tradições. As casas caiadas com as suas janelas e platibandas com cor e as chaminés típicas fazem com que um passeio pelas suas ruas seja um momento de beleza.

Já houve aqui água em abundância, nos dias de hoje menos mas ainda presente, e as fontes de Alte e a Queda do Vigário são imperdíveis. O acesso à última estava vedado em consequência da Covid-19, para evitar ajuntamentos, mas não deixamos de relembrar o seu ar de há dois anos (esperemos que ainda mantenha a água).


A Fonte Pequena continuava bonita com os seus arranjos decorativos em homenagem ao poeta altense Cândido Guerreiro, mas a Fonte Grande estava também com restrições pela maldita pandemia, tendo a Junta de Freguesia optado por não abrir as comportas que a enchem de água.
Ou seja, a ideia de um mergulho no interior algarvio ficou gorada. Salvou-se a visita ao castelo de Loulé, a sede de concelho deste Algarve diferente e uma cidade que merece visita antes ou após as férias na praia.