Trilho da Peneda

Às vezes é bom visitar os lugares em dias de chuva. Visitada a Peneda no Verão, perceber-se-á a cascata que jorra água pelo penedo abaixo que serve de encosto ao seu Santuário?

Foi precisamente essa a imagem que nos tocou ver no início desta caminhada de 11 quilómetros designada por Trilho da Peneda, já no concelho de Arcos de Valdevez. O que acontece é que a chuva miudinha não nos largou durante toda a manhã e, pior, a nebulosidade era muita. Mas mesmo com pouca visibilidade seguimos adiante no nosso propósito e subimos os últimos patamares da escadaria do Santuário de Nossa Senhora da Peneda.

O culto mariano neste lugar tem 800 anos, quando, diz a lenda da Peneda, Nossa Senhora aqui terá aparecido a uma criança que pastoreava cabras e, após curar uma mulher de um caso já dado como perdido, lhe terá dito para pedir aos habitantes da Gavieira (sede da actual freguesia da Peneda) para erigirem uma ermida. O Santuário é, todavia, mais recente, tendo sido construído nos séculos XVIII e XIX. A escadaria das virtudes é a grande atracção cénica e formal, com estatutária representando a Fé, a Esperança, a Caridade e a Glória.

Nas costas do Santuário fica a carismática Fraga da Meadinha. A parede da Meadinha tem vindo a ser escalada por portugueses e sobretudo galegos desde a década de 1940 e é hoje a única onde se pode escalar legalmente no Parque Nacional da Peneda-Gerês. São 59 as vias de escalada desta fraga. Mas nós, apesar de a termos subido também, não o fizemos através de uma ascensão vertical, antes pelo bosque que a atalha mais suavemente. Apesar da nebulosidade intensa, as cores do bosque fizeram questão de se exibir. O penedo, esse, como é cinzento como a cor daquele dia, é que foi mais difícil de perceber em toda a perfeição. Ainda assim, conseguimos ver a água a rolar por entre as frechas da rocha, a tal que se transforma em cascata quando a queda surge mais abrupta nas costas do Santuário.

A subida é algo cansativa, indo dos 665 metros aos 1095 metros em apenas 3,7 quilómetros. Mas a quase 1000 metros temos um lago com uns reflexos incríveis, uma espécie de resistência à desfeita do clima. Conhecido como “pântano”, no lugar de Chã do Monte havia uma represa que servia uma mini-hídrica que fornecia energia eléctrica à povoação da Peneda. Hoje resta a água, com um belo rochedo no meio, circundada pelo granito que permite que uma vegetação rasteira verdíssima dele se apodere nas margens do lago.

O caminho prossegue por um campo de pedras com formas diversas. É basicamente um trilho sobre pedras, em que podemos saltitar de umas para as outras. Os afloramentos rochosos são fantásticos.

E vemos árvores negras despidas, outras inclinadas. O clima não perdoa. Indiferentes a ele, as vacas barrosãs e os cavalos garranos seguem nas suas vidas. Surpreende ver uma vaca descobrindo alimento mesmo em cima de um penedo. Outras passeiam juntas e assustam-se à nossa passagem, talvez não esperando que uns malucos caminheiros ali aparecessem com um tempo destes.

Os últimos 4 quilómetros do trilho são sempre a descer e o último segue pela estrada. À aproximação da aldeia da Peneda vemos uns prados com um tapete de um verde intenso, apenas perturbado pelos muros de granito que dividem as pequenas propriedades.

A cor é garantida pela chuva, sim, mas também por se situar na margem do rio da Peneda. Neste ponto o rio não parece correr muito tranquilo, encontrando no seu caminho uma série de pedras que tem de ultrapassar por vezes com alguma fúria. Na terra da pedra, não podia faltar um imenso monólito que servirá de arrumos – é ver a porta de madeira que lhe foi adossada.

Neste trilho da Peneda estão praticamente todos os elementos característicos do Parque Nacional da Peneda-Gerês: cascata, lagoa, rio, penedos, bosques, fauna, aldeias, espigueiros e socalcos. Na vizinha freguesia do Sistelo podem estar os socalcos mais conhecidos do Parque, mas estes da Peneda possuem um encanto muito próprio. E, junto ao Santuário, são uma bela forma de terminar este passeio pela natureza e modos de vida da serra, com mais um grande exemplo de como o Homem soube aproveitar as dificuldades dos terrenos para os transformar, vencendo engenhosamente os desníveis de forma a obter para si a maior área de terra possível para a agricultura, garantindo a sua subsistência e sobrevivência.

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